CULTURA PRETA, REPRESENTATIVIDADE E ANTIRACISMO
OS DISCURSOS E DISPUTAS EM TORNO DE "A PEQUENA SEREIA"
Resumo
Este trabalho discute os modos pelos quais a política identitária ao redor e no cerne do filme A Pequena Sereia (2023) é tratada enquanto elemento constitutivo de um projeto político-econômico de sobrevivência da empresa estadunidense Disney. Nesse mesmo sentido, este artigo problematiza também os efeitos e implicações do tratamento dispensado a essa política identitária, que se associa às subjetividades e culturas negras, bem como à luta antirracista que estas demandam. Para tanto, recorre-se à metodologia dos Estudos Culturais (MORAN, 2015; CASHMORE, 1997) e a uma perspectiva eventualmente comparativa entre as versões do filme em 1989 e 2023. Empregam-se também, no bojo teórico desse debate, referenciais que tematizam identidades e manifestações culturais negras dentro e fora da indústria cultural, como Hooks (1995), Lee e Rover (1993), Haider (2019), dentre outros. Resultados dessa incursão analítica sugerem que o filme, a despeito de sua centralidade pretérita na branquitude, é artificialmente alterado para assegurar, dentre outras coisas, a aparência de inovação/disrupção, a partir de uma leitura mercadológica que a Disney opera de seus rivais na indústria. Semelhantemente, a companhia configura/lança a obra na esperança de garantir lucros financeiros e simbólicos mais abundantes. Ao mesmo tempo, a empresa se utiliza da obra para ofertar uma responsividade às demandas sociais por representação negra no cinema e ensaia uma execução de justiça/reparação histórica para com a cultura afro em pretensa oposição ao seu passado racista.