Mente e natureza: O caráter distintivo da ação humana
Resumo
O debate contemporâneo em Filosofia da Mente, impulsionado
pelos avanços das pesquisas advindas das Neurociências e da
Inteligência Artificial, tem sido bastante diversificado e divide opiniões
a respeito do projeto científico para o estudo da mente, de uma
psicologia científica capaz de estabelecer leis estritas que expliquem e
predigam a ação humana.
De um lado, as investigações nas áreas da Neurociência e da
Inteligência Artificial concentram esforços na tentativa de reduzir a
mente ao cérebro. Esse projeto reducionista tem sido estimulado por
pesquisas que procuram compreender a base do comportamento e do
pensamento humano através de estudos da estrutura e funcionamento
do sistema nervoso. Essas pesquisas tentam correlacionar estados
mentais com atividades cerebrais e consistem em saber se o mental
pode ser descrito em termos totalmente não-intencionais, colocando
os humanos e todos os seres biológicos inteligentes como casos
particulares dos fenômenos físicos.
Por outro lado, sabemos por experiência própria que temos crenças,
sensações, pensamentos, sentimentos, emoções, desejos, intenções,
etc. e que estes estados caracterizam a nossa vida mental. Normalmente
nos referimos a estes estados internos para descrever e explicar os
nossos comportamentos, afirmamos que nossas ações foram causadas
por estes estados mentais subjetivos, em outras palavras, justificamos e
racionalizamos as nossas condutas utilizando um vocabulário psicológico
que designa entidades mentais – chamado de Psicologia Popular.
Será que um conhecimento completo das interações físico-químicas
do nosso sistema nervoso fará com que abandonemos as explicações
psicológicas das ações humanas? Um vocabulário fisicalista seria
capaz de abarcar toda a complexidade do comportamento humano?
Uma explicação física é suficiente para que possamos compreender as
nossas próprias ações e as dos outros indivíduos com quem interagimos
na nossa vida ordinária?
Parece que não há um acordo legítimo quanto à resposta a essas
questões, entretanto as pesquisas científicas direcionadas à análise do
cérebro corroboram cada vez mais a crença de que as atividades mentais
devem estar relacionadas com as operações de certos mecanismos
corporais, esses estudos empíricos comprovam que a mente é de fato
um fenômeno que faz parte do mundo natural.
A despeito da sua natureza material, este trabalho tem como
objetivo defender que os eventos mentais, na medida em que são
utilizados para descrever e explicar as ações humanas, não podem ser
reduzidos aos seus constituintes físicos, visto que o comportamento
dos seres humanos não pode ser explicado da mesma maneira que
explicamos o comportamento dos outros sistemas físicos. Há algo na
ação humana – o seu caráter intencional – que a distingue da conduta
dos outros artefatos materiais, isso impede qualquer tipo de redução
dos conceitos psicológicos aos conceitos das ciências naturais.
Assim, a primeira parte desse trabalho versará sobre o significado
do naturalismo, esclarecendo os seus principais conceitos e teses que
influenciaram a perspectiva fisicalista no estudo da mente. Logo em
seguida, será apresentada uma versão fisicalista não-reducionista dos
eventos mentais, mais especificamente, a tese do Monismo Anômalo de
Donald Davidson, segundo a qual os eventos mentais estão relacionados
causalmente aos eventos físicos, entretanto não podem ser explicados
pelas ciências físicas, pois a sua explicação perpassa pela interpretação
linguística e abrange uma relação complexa com outros eventos e
condições mentais, cuja descrição física não consegue abarcar.
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