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ISSN - 2237-7840

POLÍTICAS PÚBLICAS PARA MULHERES: análise do atendimento das mulheres vítimas de violência
doméstica a partir do centro de referência da mulher no município de Mossoró/RN
PUBLIC POLICIES FOR WOMEN: analysis of care for women victims of domestic violence from the
reference center for women in the municipality of Mossoró/RN


Magna Karol Alves de Paiva 1
Terezinha Cabral de Albuquerque Neta Barros 2



Resumo:
A violência contra as mulheres no Brasil, estruturante e culturalmente enraizada,
é alarmante. Estudos evidenciam que a violência doméstica aumentou 0,6% em
2021, o que corresponde a 230.681 agressões sofridas por mulheres em seus
lares (FBSP, 2022). Diante do exposto, este trabalho busca analisar o atendimento
prestado às mulheres vítimas de violência doméstica pelo Centro de Referência
da Mulher (CRM), no município de Mossoró/RN, que está inserido nos serviços
especializados de atendimento às vítimas de violência doméstica (BRASIL, 2013),
apresentando como objetivos específicos: o panorama das políticas públicas para
as mulheres em Mossoró/RN, os tipos de violência mais relatados nos
atendimentos, os perfis socioeconômicos dessas mulheres e os tipos possíveis de
perpetradores. A metodologia utilizada foi a qualiquantitativa, com dados
disponibilizados pelo equipamento e entrevistas semiestruturadas com os
profissionais do CRM. Como resultados, constatou-se que os tipos de violência
mais relatados são a violência psicológica, seguida da violência física — em um
contexto em que a maioria das mulheres depende economicamente dos seus
companheiros e em que o referido equipamento ainda é deficitário. Além disso, o
município não tem plano municipal, conselho de direitos das mulheres e OPM -
Organismo Executivo de Políticas para as Mulheres para implementar e monitorar
as políticas direcionadas a esse público no município e atuar no enfrentamento à
violência doméstica.
Palavras-chave:Políticas Públicas; Mulheres; Violência Doméstica.


Abstract:
Violence against women in Brazil, structurally and culturally rooted, is alarming.
Studies show that domestic violence increased by 0.6% in 2021, which
corresponds to 230,681 aggressions suffered by women in their homes (FBSP,
2022). Given the above, this work seeks to analyze the care provided to women


1 Universidade do Estado do Rio Grande do Norte/UERN E-maiL: karolmagna17@gmail.com
2 Universidade do Estado do Rio Grande do Norte/UERN. E-mail: terezinhacabral@uern.br



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victims of domestic violence by the Women's Reference Center (CRM), in the
municipality of Mossoró/RN, which is part of the specialized services for victims of
domestic violence (BRASIL, 2013), presenting as specific objectives: the
panorama of public policies for women in Mossoró/RN, the types of violence most
reported in the consultations, the socioeconomic profiles of these women and the
possible types of perpetrators. The methodology used was qualitative and
quantitative, with data provided by the equipment and semi-structured interviews
with CRM professionals. As a result, it was found that the most frequently reported
types of violence are psychological violence, followed by physical violence — in a
context in which most women are economically dependent on their partners and in
which the aforementioned equipment is still deficient. In addition, the municipality
does not have a municipal plan, a women's rights council and OPM - Executive
Body for Women's Policies to implement and monitor policies aimed at this public
in the municipality and act in the fight against domestic violence.
Keywords: Publics Polices; Womans; Violence domestic.



1. Introdução

Os movimentos feministas foram o aporte para a construção de diversas lutas, e desde 1970 estão
interligados com questões sobre direito ao voto, direitos sexuais e reprodutivos e a pauta da violência
doméstica. Pode-se dizer, na análise da ótica feminista, que o corpo da mulher sempre foi controlado pelo
poder público, como no controle da maternidade ou na sua interrupção, ambos os processos regulados por
lei. Esperava-se que este rigor no controle dos corpos das mulheres também estivesse presente no combate
à violência doméstica por elas sofridas. Mas em contradição, quando se trata da questão da violência contra
as mulheres, o poder público abandona esse segmento, que só através de muitas lutas veio, de fato, a
concretizar alguns os direitos e as demandas que buscava.
Pensando nisso, este trabalho tem como objetivo analisar o serviço especializado de atendimento às
mulheres vítimas de violência doméstica na cidade Mossoró-RN, conhecido como Centro de Referência da
Mulher (CRM) — que se subdivide em trazer uma discussão sobre gênero e violência, bem como na criação
de políticas públicas para as mulheres e de serviços especializados no atendimento à violência doméstica
—, procurando analisar quais os tipos de violência mais relatados pelas mulheres no CRM, buscando traçar
os possíveis perfis dos perpetradores, identificando os aspectos socioeconômicos dessas mulheres e
fazendo um levantamento das atividades desenvolvidas no CRM.
A relevância dessa pesquisa está na contribuição para a sociedade, como um importante elemento para
suscitar a reflexão a partir da análise dos dados coletados, já que é de relevância que existam dados para
a criação de políticas públicas para as mulheres, bem como para o aprimoramento das já existentes, de
forma que possam abarcar questões como vulnerabilidade social, questões de raça e geracionais e que, de
fato, consigam chegar a elas, a partir das análises apresentadas no trabalho exposto.
O trabalho dividiu-se em sete partes, além dessa introdução, de como foi construído metodologicamente e
a conclusão, tem-se o referencial teórico recapitulando os movimentos feministas e as políticas públicas
para as mulheres, em seguida os dados de violência doméstica no Brasil, Rio Grande do Norte e em
Mossoró. Ainda, as políticas públicas para as mulheres existentes no município de Mossoró. Por fim,



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apresentamos o Centro de Referência da Mulher- CRM, e analisaremos o serviço especializado de
atendimento às mulheres.


2. Metodologia

O trabalho tem como procedimento metodológico uma pesquisa pela bibliografia acerca da violência
doméstica (BANDEIRA, 2017; BANDEIRA e ALMEIDA, 2013; MACHADO, 2010; SCOTT, 1989), além dos
dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP, 2022) sobre a violência doméstica no Brasil, dos
dados do Óbvio - Observatório de Violência da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2021) e dos
dados da MUNIC (IBGE, 2018) acerca das políticas públicas existentes no Rio Grande do Norte e Mossoró.
As técnicas utilizadas foram norteadas a partir de entrevistas semiestruturadas aplicadas com os
profissionais do Centro de Referência da Mulher em Mossoró. Entende-se que as entrevistas
semiestruturadas são pontos previamente estabelecidos, mas com liberdade para o entrevistador fazer as
perguntas, e mediante vão surgindo outras questões elas podem ser perguntadas, como uma conversação
informal. Diante disso, a pesquisa de campo foi realizada no Centro de Referência da mulher com os
profissionais que compõe a equipe, no mês de setembro de 2021 e março de 2022. Para garantir o sigilo
dos profissionais, as entrevistas foram gravadas e descartadas após a transcrição, foram assinados termos,
e a utilização de nomes fictícios no trabalho.


3. Lutas, conquistas e permanências


Mesmo com tantas conquistas no que concerne aos direitos das mulheres, salientamos que nada foi de
forma linear e triunfal, mas sim de muita luta pela dignidade das mulheres. As reivindicações feministas
como o direito à igualdade formal; à liberdade sexual e reprodutiva; à igualdade econômica; às redefinições
de papéis sociais e o direito à diversidade, no tocante à raça e etnia, foram assim se incorporando aos
tratados internacionais de direitos humanos para que posteriormente pudessem ser revertidos em planos,
programas e projetos (PIOVESAN, 2014).
Mas no campo de gênero, as políticas são recentes, já que antes eram desenhadas e implementadas por
grupos das elites — eram feitas por homens brancos, heteronormativos, com alta escolaridade e ricos.
Nesse caso, as pessoas que eram mais afetadas não participavam como vozes ativas nesse processo; as
mulheres não estavam presentes na política, nem na tomada de decisões, nem na implementação, nesse
caso as políticas nem eram destinadas a elas (BANDEIRA; ALMEIDA, 2013).
Nesse sentido, quando se fala em políticas públicas de gênero, deve-se considerar o sentido das mudanças
pretendidas, com vistas a contemplar a dimensão da autonomia das mulheres e a condição emancipatória.
Para o gênero ser incluído nessa perspectiva, é preciso entender todo o arcabouço dessas relações sociais,
além de que, para combater essas desigualdades, tem que se considerar toda a construção sócio-histórica
e cultural herdadas, considerando raça/etnia, classes sociais e fatores geracionais.



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Bandeira e Almeida (2013) afirmam que as políticas públicas, quando dirigidas às mulheres, não partem de
uma perspectiva de gênero, sequer a contemplam, já que as estruturas jurídicas e institucionais têm uma
linguagem masculina e exclusiva que já está introjetada e disseminada na sociedade. Com isso, as políticas
públicas de gênero consideram as subjetividades e a diversidade dos processos de socialização, cujas
dificuldades e negociações estão presentes nas relações interpessoais entre homens e mulheres, e
internamente entre homens ou mulheres. Já as políticas públicas para as mulheres focam no feminino que
parte de uma relação em priorizar a família, ou seja, focam em visões tradicionais do feminino.
De fato, ao se falar de políticas públicas para mulheres, entende-se que mesmo focando na questão da
mulher, os programas e ações desenvolvidas envolvem a autonomia, igualdade, e estão assentados nas
questões da desigualdade que as mulheres enfrentam. Em contrapartida, entende-se que utilizar gênero é
muito importante, não só como um “sinônimo” para mulheres, mas para entender e analisar as
desigualdades entre homens e mulheres, e as diferenças que permeiam as mulheres, como as de classe,
relações geracionais, raça/étnica, religiosa e entre outras (BRASIL, 2006).
Mesmo com a criação da Secretaria de políticas para as mulheres em 2003, bem como do I Plano de
Políticas para as mulheres (BRASIL, 2006), com os objetivos a serem cumpridos relacionados aos avanços
dos direitos das mulheres, com a expansão da Delegacia de Atendimento à Mulher (DEAM) se consolidando,
ainda faltava uma lei que protegesse as mulheres, que atuasse na prevenção dessa violência, com diversos
aparatos que pudessem, junto com a criação de políticas públicas e programas para as mulheres, coibir a
violência. Mas o Estado Brasileiro, de fato, só promulgou essa lei depois de inúmeras denúncias de omissão
e negligência em relação à violência doméstica que Maria da Penha Fernandes sofreu e a tentativa de
homicídio que a deixou paraplégica em 1983 – em um contexto em que o seu agressor só foi preso em
2002. Assim, o Brasil teve que colocar uma lei que amparasse as mulheres e as protegesse da violência.
Com isso, veio a Lei Maria da Penha, considerada uma das mais avançadas do mundo no enfrentamento à
violência doméstica e familiar contra a mulher.
A partir disso, é importante destacar a criação e os avanços da Lei Maria da Penha 11.340, de 2006, com
46 artigos distribuídos em 7 títulos. A lei cria mecanismos para “coibir e prevenir a violência doméstica e
familiar contra a mulher”, nos termos do capítulo 8° do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre
a Eliminação de Todas as formas de Violência Contra a Mulher, da Convenção Interamericana para
Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher, além de outros tratados internacionais, que dispõem
da criação de Juizados de Violência Doméstica e Familiar e estabelecem medidas de assistência e proteção
às mulheres em situação de violência doméstica e familiar (BRASIL, 2006).
Antes da lei ser criada, a violência doméstica e familiar era tipificada como crime de menor potencial
ofensivo, enquadrada pela Lei n. 9.099/1995, isso significava que a violência doméstica era banalizada.
Assim, as penas eram pagas com cestas básicas e trabalhos comunitários — nesse caso, o autor da
violência não tinha um dispositivo legal que o punisse pela violência praticada. Como já destacado, a
violência sempre foi vista como naturalizada, não só pela sociedade, mas pelo Estado brasileiro, já que só
foi a partir de muitas reivindicações dos movimentos feministas que, de fato, se criou uma lei que punisse
os agressores, mas não só isso, que buscasse o fortalecimento das mulheres, a sua autonomia e
empoderamento, criando meios humanizados e assistenciais para elas.
Com a lei, a violência doméstica e familiar passa a ser crime, tirando a questão do menor potencial ofensivo.
Além disso, uma das inovações são as medidas protetivas de urgência e os equipamentos para fortalecer a
lei como: as Delegacias Especializadas de Atendimento à mulher, Casas-abrigo, Centros de Referência da
Mulher e Juizados de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher e outros. A lei também estabelece o
que é violência doméstica e familiar, como também suas formas: física, psicológica, patrimonial, sexual e
moral.



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Essa lei também cria mecanismos de proteção às vítimas de violência, assumindo que a violência contra a
mulher é de responsabilidade do Estado brasileiro, e não só uma questão familiar — como por muitos anos
foi endossada. Segundo o art. 6º da Lei Maria da Penha, “a violência doméstica e familiar contra a mulher
constitui uma das formas de violação dos direitos humanos”, assumindo, assim, os inúmeros tratados
internacionais que tratam da violência doméstica. Destaca-se também que a lei não trata somente de punir
os agressores, mas de providenciar medidas protetivas de urgência e assistenciais, como a criação de
políticas públicas de proteção às vítimas, além de estabelecer a criação de programas educacionais que
visam a igualdade de gênero, na perspectiva de raça e etnia. Todos esses dispositivos tratam de intensificar
uma rede integrada de combate à violência doméstica e familiar, já que não se trata apenas de punir o
agressor, mas de criar meios de coibir a violência, além de dar suporte às mulheres, como uma rede
integrada que acolha e tenha escuta qualificada.
A medida protetiva de urgência é um dos destaques da Lei Maria da Penha, já que pode proteger a vítima
quando ela estiver em risco de morte, podendo ser solicitada pelos magistrados, inclusive no atendimento
na delegacia, com isso podendo determinar: a proibição ou restrição da arma pelo agressor; o afastamento
do agressor da casa; a proibição do agressor de se aproximar da mulher; a restrição ou suspensão de visitas
aos dependentes menores; a obrigatoriedade da prestação de alimentos provisórios; a restituição de bens
indevidamente subtraídos pelo agressor; a proibição de venda ou aluguel de imóvel da família sem
autorização judicial; o depósito de valores correspondentes aos danos causados pelo agressor, entre
outros.(IMP, 2018).
O II Plano Nacional de Políticas Para as Mulheres (BRASIL, 2008) é orientado pelos princípios de igualdade
e respeito à diversidade, equidade, autonomia das mulheres, de laicidade do Estado, de universalização
das políticas, de justiça social, transparência e controle social. Partindo disso, o Plano complementa e toma
como base o I PNPM, com algumas modificações. O primeiro capítulo diz respeito à autonomia econômica
e igualdade no mundo do trabalho, com especial atenção para a inclusão social dessas mulheres, e para as
mulheres negras. O segundo capítulo diz respeito à educação inclusiva, não sexista, não lesbofóbica, não
racista, não homofóbica, com ênfase na importância de uma educação inclusiva sem desigualdades para
as mulheres; no terceiro capítulo, compreende-se a saúde das mulheres e os direitos sexuais e reprodutivos,
tendo por objetivos que as mulheres tenham acesso à saúde de qualidade e a direitos reprodutivos (BRASIL,
2008).
Compreende-se, então, os eixos estruturantes da proposta: a garantia da aplicabilidade da Lei Maria da
Penha; ampliação e fortalecimento da rede de serviços para mulheres em situação de violência; garantia da
segurança cidadã e acesso à justiça; garantia dos direitos sexuais e reprodutivos, enfrentamento à
exploração sexual e ao tráfico de mulheres; garantia da autonomia das mulheres em situação de violência
e ampliação de seus direitos. O pacto parte da premissa de que a violência constitui um caráter
multidimensional, que requer a implementação de políticas públicas que visem diversos eixos, como
educação, saúde, segurança pública, assistência social, entre outros.
Pode-se destacar um dos eixos, que foi colocado pelo Pacto, no que diz respeito à materialização da rede
de atendimento à mulher, sendo um conjunto de redes e serviços que inclui a assistência social, a saúde,
justiça e segurança pública que busca melhorar a qualidade do atendimento às mulheres, a identificação e
o encaminhamento, como também dar um suporte humanizado às mulheres em situação de violência.
Sendo dividida em duas principais categorias de serviço, como podemos observar no quadro abaixo (Quadro
1).

Quadro 1- Categorias de serviços especializados e não especializados no atendimento da violência
doméstica



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Serviços não especializados Serviços Especializados no atendimento a Mulheres em
situação de violência

Hospitais em gerais Centros de Atendimento à Mulher em situação de violência (Centros
de Referência de Atendimento à mulher)

Serviço de atenção básica (UBS)
Centro de Referência em Assistência Social (CRAS) Casas Abrigo
Delegacias comuns Casas de Acolhimento Provisório (Casas de Passagem)
Política Militar Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAM)
Polícia Federal Núcleos especializados de atendimento às mulheres nas

delegacias comuns
Ministério Público
Defensorias Públicas

Núcleos da Mulher nas Defensorias Públicas
Promotorias Especializadas
Juizados Especiais de Violência Doméstica e Familiar contra a
Mulher


Programa saúde da família
Posto avançado de atendimento á migrante

Central de Atendimento à Mulher - Ligue 180, Ouvidoria da Mulher
Serviços de saúde voltados para o atendimento aos casos de
violência sexual e doméstica
Serviços de Atendimento em Fronteiras Secas (Núcleos da Mulher
na Casa do Migrante).
Casa da Mulher Brasileira
Centro de Referência Especializado em Assistência Social
(CREAS)


Fonte: Elaboração própria, a partir de Brasil (2011).
É importante destacar que nos serviços especializados, em muitos estados e municípios, as mulheres não
têm o devido acesso, ou então esses serviços não são bem divulgados, já que, dependendo do estado, as
delegacias especializadas de atendimento à mulher (DEAM), por exemplo, só estão disponíveis em
localidades com maior população — e os interiores só têm a primeira porta de entrada ao serviço, não
especializado no atendimento dessas mulheres, o Centro de Referência em Assistência Social (CRAS), que,
por muitas vezes, não possui profissionais com capacitação para lidar com mulheres em situação de
violência, tendo que encaminhá-las para lugares que possuam o serviço especializado e exclusivo a elas.
O III Plano Nacional de Políticas Para as Mulheres de (BRASIL, 2013-2015) traz novos objetivos para a
ampliação de políticas públicas às mulheres, principalmente as em situação de violência doméstica,
trazendo inovações como a interseccionalidade que abarca as mulheres em suas diversas estruturas,
étnicas, raciais, regionais, fazendo com que se analise o eixo das estruturas das mulheres que sofrem
violência. Outro destaque criado são os Organismo Executivo de Políticas para as Mulheres-OPMS,
servindo como ferramentas de formulação, monitoramento e coordenação de políticas que promovem a
defesa dos direitos das mulheres, tanto nos âmbitos locais como nos nacionais (BRASIL, 2019). Segundo
dados do IPEA (2015), até julho de 2013 existiam 583 organismos de Políticas Públicas para as Mulheres
em 560 municípios, somadas às esferas estaduais e municipais.
Mesmo com tantas redes de enfrentamento à violência contra a mulher, amparada em planos, diretrizes,
programas e leis, são alarmantes os números da violência, que muitas vezes leva as mulheres à morte —



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quando chegamos ao ciclo final dessa violência, em que acontece o feminicídio. Entende-se que o
feminicídio é crime no Brasil, desde o dia 9 de março de 2015, em que foi vigorada a lei n° 13.104/2015,
que considera o feminicídio como crime de homicídio hediondo por razões da condição do sexo feminino.
Considera-se feminicídio quando há razões da condição do sexo feminino, quando se tem violência
doméstica e familiar e menosprezo e descriminação à condição de ser mulher. Cabe ainda ressaltar que a
adoção do feminicídio enquanto lei e crime hediondo foi tardia no Brasil, já que desde os anos 2000 países
da América Latina, como o México, já tinham alguma lei direcionada aos homicídios das mulheres (LEITÃO;
ANDRADE, 2020).
Mas para as iniciativas serem colocadas em prática, de fato, é preciso fiscalização, participação e controle
social dessa política, já que existem diferenças entre os estados e municípios brasileiros, considerando
orçamentos, recursos humanos, capacitação desses profissionais para trabalhar com essas mulheres em
situação de violência, além de que se concretize a implantação seguindo o Plano que está sendo colocado,
por que há diferença entre o que se coloca e o que, de fato, é concretizado, pois há diversos desafios no
que concerne às políticas públicas para as mulheres.


4. Violência doméstica no Brasil

Os dados do Atlas da Violência 2020 (IPEA, 2020), no Brasil, mostram que em 2018 a cada duas horas uma
mulher foi assassinada no Brasil, um total de 4.519, o que representa uma taxa de 4,3 mil homicídios por
100 mil habitantes. Entre 2017 e 2018, houve uma queda de 9,3% nos homicídios, mas essa redução se
remeteu apenas às mulheres não negras. Se entre 2017 e 2018 houve uma queda de 12,3 % nos homicídios
de mulheres não negras, nos de mulheres negras essa redução foi apenas de 7,2%.
Isso quer dizer que, em 2018, 68% das mulheres assassinadas no Brasil eram negras. Assim, percebe-se
o quanto é importante analisar o recorte da desigualdade racial entre as mulheres que sofrem violência,
visto que os dados demonstram o quanto as mulheres negras estão mais propícias à violência no Brasil, e
o quanto isso está alicerçado a uma série de fatores que não se tratam de uma junção de desigualdades,
mas sim de que uma desigualdade vai imbricando na outra, na questão de classe, raça e gênero.
Em relação à violência corporal dolosa, no Brasil, em 2018, segundo o Mapa da Violência Contra a Mulher
(2018), a cada 17 minutos uma mulher é agredida fisicamente. De meia em meia hora uma mulher sofre
violência psicológica ou moral. Essa violência acontece dentro de casa, por namorados, ex-namorados,
maridos ou ex-maridos motivados por sentimento de posse, ciúmes, raiva, “desobediência” ou porque o
almoço não saiu cedo, os usos de argumentos são diversos. Segundo Blay (2014, p. 25), é difícil isolar um
fator apenas por causa da violência contra a mulher, são múltiplos.
Já em 2019 tem-se um crescente nos dados de violência: a cada 2 minutos, uma mulher sofreu violência
física no Brasil, e 267.930 foram os registros de lesão corporal dolosa, que se refere à violência física que
ocorre no âmbito familiar. Nesse sentido, o crescimento da violência contra as mulheres no Brasil foi de
5,2%. Sendo importante destacar que a Lei Maria da Penha tipifica a violência doméstica e familiar e tem
como medidas protetivas todo o apoio à vítima, a seus dependentes, além de um lugar seguro no caso de
afastamento, alimentação, moradia e outros parâmetros e de propiciar a prisão preventiva do agressor, mas,
de fato, para que isso ocorra, para que as mulheres quebrem o ciclo de violência, elas precisam entrar em
contato para que alguma medida seja feita, através da denúncia — que muitas vezes elas não conseguem
fazer por medo, rejeição, culpa, ameaça dos agressores e por não possuírem ajuda de parentes e outras
pessoas.



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O disque 180, em 2019, registrou 85.412 denúncias, as que foram mais recorrentes eram de violência
doméstica: (76,96%); tentativa de feminicídio (4,35%); violência moral (4,08%); ameaça (3,81%). Os
suspeitos em 84% são do sexo masculino; e dos registros, 55,47% têm relação com a vítima. A relação que
as vítimas têm com o agressor: 26,67% são companheiros; 15,13% ex-companheiros e 10,67% são
cônjuges (BRASIL, 2020).
A categoria da violência doméstica no disque 180 subdivide-se: 61,11% violência física; 19,85% violência
moral; 6,11% tentativa de feminicídio; 5,76% violência psicológica e violência patrimonial 2,20%. As
mulheres que mais buscam ajudam no serviço se declaram pardas com faixa etária entre 25 e 30 anos,
correspondendo a 20.479 ligações. Nos registros de violência doméstica e familiar, os vínculos mais
recorrentes que as vítimas têm com os agressores são: companheiros (33,15%); ex-companheiros
(17,94%); e cônjuge (12,13%).
No Brasil, 15,4% das mulheres deixaram de realizar algum tipo de atividade habitual por consequência da
violência sofrida, seja a violência física, sexual ou psicológica. Essas consequências foram avaliadas pela
Pesquisa nacional de saúde (PNS, 2021), que verificou que as mulheres sofrem consequências:
psicológicas, como medo, tristeza, desânimo, ansiedade para dormir, depressão entre outras; físicas, como
hematomas, queimaduras, cortes, fraturas e outras lesões; e sexuais, como doenças sexualmente
transmissíveis e gravidez indesejadas. Ressaltando que a violência sexual pode trazer consequências
psicológicas e físicas, bem como a violência física pode acarretar consequências psicológicas. Então, um
tipo de violência pode trazer inúmeras consequências para a vida das mulheres, fazendo com que elas não
consigam fazer suas atividades, seus afazeres e continuar sua vida normal.
Quando observamos os dados sobre o feminicídio, segundo o Atlas da Violência (IPEA,2020), os homicídios
ocorridos dentro da residência, 30,4% em 2018, podem ser tipificados como feminicídio — um crescimento
de 6,7% em relação a 2017. Além disso, ainda há questões que tendem a não identificarem os homicídios
de mulheres com feminicídio, mesmo depois que a Lei foi tipificada em 2015, definindo assim o crime de
homicídio das mulheres a partir de um contexto de violência doméstica e familiar, ou pelo menosprezo às
mulheres e discriminação à condição feminina, só pelo fato de ser mulher.
Embora entre 2013 e 2018, segundo o Atlas da Violência (IPEA,2020), os homicídios fora de casa tenham
diminuído 11,5%, as mortes dentro de casa aumentaram 8,3 %, indicando um crescimento de feminicídio.
Quando se observa os dados referentes a 2020, contabiliza-se subnotificações, já que devido à pandemia
da Covid-19, que se alastrou pelo mundo, a violência contra a mulher também teve um aumento. Com o
isolamento social, que fez com que as mulheres permanecessem mais tempo em casa com seus
perpetradores, e com os equipamentos e serviços funcionando de forma remota, para assim conter o vírus,
a violência aumentou e essas mulheres não conseguissem denunciar.
Já no relatório do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP, 2021), publicado em julho de 2021, verifica-
se em todas as delegacias a redução das denúncias de crimes, mesmo assim se consideram exorbitantes
os números, já que 230.160 mulheres denunciaram um caso de violência doméstica em 26 unidades
federativas (UFs) no ano de 2020, ficando de fora apenas o Ceará. Então, a violência aumentou, mas como
as mulheres não podiam denunciar, nem sair de casa, além do funcionamento dos equipamentos de forma
remota, houve essa falsa impressão de redução nas denúncias. Essas mulheres não tinham como denunciar
de casa, ou pedir ajuda, vivenciando situações recorrentes de violência.
Os dados de violência contra a mulher contabilizaram uma redução de feminicídios em 2021, segundo o
Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP, 2022), tendo 1341 vítimas em 2021; sendo que: 68,7% têm
entre 18 e 49 anos; 65,6% morreram dentro de casa, 62% eram negras, e o perpetrador em 81,7% dos
casos era companheiro ou ex-companheiro. Essa redução no feminicídio corresponde a 1,7 %, já que em
2020 contabilizou-se 1354 feminicídios. Mas isso ainda é alarmante, considerando que a maioria das



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mulheres é morta pelos seus companheiros. E que mesmo que houve redução, os dados mostram que
houve crescimento na violência doméstica.
A violência sofrida carrega inúmeras consequências para as mulheres e para os filhos, e ao chegar no ato
extremo da consumação do feminicídio, o corpo feminino é visto pelo perpetrador como posse, como
proveito para dominá-lo e domesticá-lo (BANDEIRA, 2017). Essas mulheres passaram por diversas
violências psicológicas, patrimoniais, morais e físicas, todo um ciclo que só a denúncia quebra, mas exige
muito mais que a libertação de uma relação em que existe violência: atendimento qualificado e profissional
a essas mulheres.
Essa violência de gênero, entendida como capaz de estruturar as relações sociais, permeadas pelas
imposições dos agressores que podem ser diversas, como, ódio, rancor, desprezo, insubordinação feminina
e o desprezo ao masculino. Segundo Bandeira (2017, p. 23), “Estes sentimentos de perda sobre a
‘propriedade’ da mulher, e por tantas outras motivações em sociedades como a nossa, onde a
‘masculinidade hegemônica’ é vinculada a uma cultura de honra e de orgulho, leva o homem a querer manter
o controle sobre o corpo feminino e a sexualidade”. E quando eles perdem esse controle, eles recorrem à
violência.
Assim, essa violência interpessoal, presente nos lares das famílias, é vista pelos filhos que carregam essas
situações por toda a sua vida, trazendo inúmeras consequências, fazendo com que eles incorporem como
algo natural as relações violentas, como o controle das mulheres, vistas como habituais. Cotidianamente
vivenciam que os homens, os chefes da família, não são contrariados, que as mulheres têm que obedecê-
los, pois assim controlam e intimidam os membros familiares.
Nesse sentido, a mulher se sente com medo, e muitas vezes se sente culpada pela agressão e não
denuncia, como também os familiares a induzem a não denunciar, por normalizarem a violência e a
permanência na relação, pela noção de manter um casamento nos padrões seguidos por uma moral ou
religião, e pelos filhos.


5. Gênero, violência e Políticas públicas em Mossoró/RN

No Rio Grande do Norte, a violência doméstica pode ser destacada como alarmante, já que a cada 3 dias
uma mulher foi vítima de morte violenta no estado entre 2011 a 2019, segundo dados do Óbvio (2021),
realidade preocupante que também se estende a Mossoró, a segunda cidade mais populosa do Rio Grande
do Norte. Segundo dados do Óbvio-RN (2021), em Mossoró a média de homicídios dolosos nos anos de
2015 a 2019 chega a ser 64,4% maior do que os feminicídios que giram em torno de 21,9% desses casos.
Muitas ocorrências não entram para a estatística por diversos fatores, um deles é a falta de denúncia e
investigação, como também o medo de denunciar.
Em relação às políticas públicas existentes no município, segundo dados da MUNIC (IBGE, 2018), a cidade
de Mossoró não possuía OPMs, não possuía Plano Municipal de Políticas para as Mulheres, mas
desenvolve Plano/Programa ou projeto a partir da administração municipal. Possui Conselhos de Direitos
da Mulher, sendo vinculados à pasta da assistência social e serviço especializado de enfrentamento à
violência contra as mulheres, como: CRM, serviço especializado de atendimento à violência sexual, DEAM
e Juizado ou vara especial de violência doméstica e familiar contra a mulher. Segundo a MUNIC
(IBGE,2018), eles fazem levantamento quantitativo de mulheres atendidas, mas não é divulgado.



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Quadro 2 - Políticas públicas e serviços especializados para as mulheres existentes no município de
Mossoró-RN até 2018

Políticas públicas e serviços especializados para as mulheres existentes no município
de Mossoró-RN até 2018

EXISTE NÃO EXISTE
Plano/programa desenvolvido a partir da
administração municipal

Organismo de Políticas para as Mulheres
(OPMS)

Conselho de direitos das mulheres vinculado à
assistência social

Plano Municipal de Políticas para as
mulheres

Serviço especializado de enfrentamento à
violência contra as mulheres, como: Centro de
Referência e Atendimento à Mulher (CRM),
serviço especializado de atendimento à
violência sexual, DEAM e Juizado ou vara
especial de violência doméstica e familiar
contra a mulher

Promotoria Especializada ou Núcleo de
gênero do Ministério Público;
Defensorias da Mulher ou Núcleo Especial
de Defesa dos Direitos da Mulher (Nudem);
Casa da Mulher Brasileira;
Serviço de responsabilidade do Agressor

Fazem quantitativo de mulheres atendidas,
porém não divulgam.


Fonte: Elaboração própria a partir do banco de dados do IBGE- Pesquisa de informações básicas Municipais
MUNIC (2018).
Destaca-se no quadro acima (Quadro 2) que o Conselho de Direitos das Mulheres, no ano de 2022,
encontra-se desativado, como não tem nenhum plano executado para as mulheres que se vincula à
administração, apenas o Centro de Referência vinculado à administração municipal continua seu
funcionamento, como os demais, a DEAM e os que são vinculados à justiça, que é o Juizado, a Promotoria
especial de violência doméstica e familiar contra a mulher e a Defensoria pública. Segundo Nunes (2017),
um OPM robusto, estabelecido e com equipes capacitadas, ajuda na intersetorialidade e induz os municípios
a introduzirem políticas para as mulheres. Tendo em vista que em Mossoró, segundo o (Quadro 2) observa-
se a falta desse OPM para essa articulação, como de um plano de políticas para as mulheres.
Como uma das medidas de coibir a violência é a proteção da vítima, foi instalada a Patrulha Maria da Penha
em Mossoró, em dezembro de 2020, tendo como objetivo fazer o acompanhamento preventivo e a proteção
de mulheres em situação de violência doméstica e familiar. Mesmo assim, observa-se que as políticas
existentes ainda são incipientes para a violência recorrente nos corpos femininos, além da falta de dados e
divulgação para que políticas sejam implementadas ou aperfeiçoadas.
A Rede de Enfrentamento à violência contra a mulher, já que só a partir desse conceito de Rede, que integra
todos os serviços especializados, como os não especializados, que se pode combater a violência contra
mulher, mas entende-se que para que essas políticas sejam, de fato, executadas, elas precisam trabalhar
em conjunto, para que as mulheres possam ter todo o apoio, seja quando ela estiver denunciando ou só
procurando acolhimento e assistência.


6. Centro de Referência da Mulher em Mossoró/RN



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O Centro de Referência da Mulher é um equipamento considerado no âmbito do Plano Nacional de Políticas
Para as Mulheres (BRASIL, 2013-2015) como uma das estruturas essenciais ao programa de prevenção à
violência doméstica, já que visa promover a ruptura da situação de violência e restabelecer a vida da mulher
e sua cidadania em termos globais através de um atendimento multidisciplinar — psicológico, social, jurídico,
informacional — para as mulheres em situação de violência.
Segundo a Norma Técnica dos Centros de Referência (2006), eles devem prestar acolhimento, atendimento
e acompanhamento às mulheres que precisem fazer articulação com a Rede, pautando-se o atendimento
no questionamento sobre a opressão e desigualdade que sofrem em relação aos homens, e a interrupção
da violência de gênero. Tendo como objetivo principal dos centros de Referência:

O objetivo primário da intervenção é cessar a situação de violência vivenciada pela mulher
atendida sem ferir o seu direito à autodeterminação, mas promovendo meios para que ela
fortaleça sua auto-estima e tome decisões relativas à situação de violência por ela
vivenciada. Ressalta-se que o foco da intervenção do Centro de Referência deve ser o de
prevenir futuros atos de agressão e de promover a interrupção do ciclo de violência
(BRASIL, 2006, p. 16)

Além disso, o equipamento é parte da administração pública municipal, assim, ele é para fazer articulação
com as demais redes no âmbito da assistência social, saúde, educação e a DEAM, como também das
defensorias públicas e juizados especializados. No tocante a Mossoró, segundo o IBGE (2021), o município,
que possui 303.792 mil habitantes, se situa no interior do Rio Grande do Norte, no Alto Oeste Potiguar. O
Centro de Referência da Mulher, que se localiza em uma área que não se delimita como central, o conjunto
Walfredo Gurgel, no bairro Alto de São Manoel, zona leste de Mossoró. Inaugurado em 2009, com o nome
“CREAS Mulher”, o equipamento atende mulheres em situação de violência, para o rompimento desse ciclo,
e assim devolver sua autonomia. A partir de 2013, mudou o nome para Centro de Referência da Mulher-
CRM, possuindo os mesmos objetivos de combate à violência contra a mulher.
Como abordado na metodologia desse trabalho, a pesquisa de campo foi realizada na instituição, uma etapa
em setembro de 2021 e outra em março de 2022. Usando nomes fictícios para o sigilo dos profissionais.
Nesse sentido, foi escolhido o Centro de Referência da Mulher porque ele compreende como serviço
especializado o atendimento às vítimas de violência e às mulheres que fazem denúncia, ou se não fazem
podem procurar o Centro por conta própria, ou são encaminhadas pelos serviços de assistência social, como
o Centro de Referência da Assistência social - CRAS, Centro de Referência Especializado da Assistência
Social - CREAS, ou pela promotoria e juizado especializados.
A entrevistada 1, Ana, relata que o Centro de Referência da mulher tem toda uma regulamentação e norma
técnica, é um equipamento público, municipal, e de referência nacional e deve trabalhar de maneira
articulada com outras instituições, como: CRAS, CREAS, promotoria e juizados.
Nesse caso, a profissional salienta que no CRM, enquanto equipamento que está dentro das diretrizes
desses planos, possuindo normas técnicas e seguindo a questão de se trabalhar com intersetorialidade e
capilaridade, não acontece essa articulação com a promotoria específica do município. Mesmo assim, ainda
se consegue bastante articulação com outros segmentos da assistência social, educação e saúde, como as
escolas, um trabalho desenvolvido com base em rodas de conversas e na transmissão de informação para
professores e alunos.
Conforme foi constatado na pesquisa, a rede ainda é bastante fragilizada, falta bastante investimento no
que concerne ao CRM, e na rede como um todo, mesmo evidenciando mudanças na gestão atual, ainda
faltam pessoas capacitadas e técnicas para atuação nessa política. Partindo para os tipos de violência mais
relatados pelas mulheres no CRM, que podem ser a violência física, psicológica, patrimonial, moral e sexual,



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previstos na Lei Maria da Penha. Conforme relatado pela entrevistada, a violência psicológica é a que se
enquadra como mais preponderante nos relatos das mulheres que são atendidas no CRM.

Nós mulheres, nós estamos sujeitas a vários tipos de violência né.... Mas assim dentro da
nossa realidade, pensando assim na violência contra a mulher, na violência doméstica,
intrafamiliar, onde a gente traz as questões da violência psicológica, patrimonial, moral,
sexual e física, aquelas 5 violências que são tratadas na própria Lei Maria da Penha
definem, dentro daquelas violências a que a gente mais escuta, que está no ranking assim,
é... o maior número é a violência psicológica, porque todas as outras, elas já acontecem
junto com a psicológica, todas as outras tem a psicológica, você não bate sem agredir,
xingar, sem menosprezar a mulher.... Então, a violência psicológica é de mais destaque
assim (Ana, entrevista realizada em 02/09/2021).

Conforme a tabela abaixo (Tabela 1), os tipos de violência mais relatados, são (por quantidade de relatos
existentes): 96 das mulheres sofrem violência psicológica, seguida da violência física, com 49 mulheres, e
da moral, com 34 relatos, além da patrimonial, com 25, e da sexual, com 15 relatos, no total dos
atendimentos.
Tabela 1- Tipo de Violência

Violência Ano
2019 2020 2021 Total

Física 25 11 13 49
Psicológica 44 18 34 96
Patrimonial 16 5 4 25

Moral 22 6 4 34
Sexual 6 3 6 15

Fonte: Dados disponibilizados pelo Centro de Referência da Mulher- CRM (2022).

Muitas mulheres, quando submetidas à violência, não percebem que aquilo é violência, e é essa não
percepção que as faz a permanecerem nas relações, já que elas estão tão abaladas, tristes, destruídas,
destituídas da certeza de quem são e desacreditadas que elas acabam por achar que merecem passar
aquilo, que a relação é regada a isso, e que se ela não aceitar, ela não é uma esposa boa para o lar e os
filhos, e assim segue na relação.
Conforme foi perguntado sobre os perfis dessas mulheres, salienta-se que os dados sobre essas mulheres
são recentes, de 2019 a 2021. A tabela abaixo (Tabela 2) traz informações acerca da faixa etária das
mulheres atendidas no CRM entre 2019 e 2021. Entre as mulheres entre 30 e 49 anos, foram atendidas 50;
e entre 17 e 29 foram 26. Dados sobre os filhos e a vida profissional não foram disponibilizados.

Tabela 2 - Mulheres Atendidas Por Faixa Etária

Idade Ano
2019 2020 2021 Total

17 a 29 9 7 10 26
30 a 49 25 10 15 50
50 a 59 7 2 5 14
60 a 69 4 2 0 6



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70 a 79 5 2 1 8
Fonte: Dados disponibilizados pelo Centro de Referência da Mulher- CRM (2022).
Diante disso, foi colocado pela entrevistada Ana que uma pesquisa desse tipo foi realizada há uns 3 anos,
conforme foi coletado nessa pesquisa, a maioria das mulheres atendidas tem filhos, mas a pesquisa não
perguntou a questão da cor, de modo que não é possível saber se eram brancas, pardas ou negras. Na
questão econômica, a maioria são dependentes economicamente, estão fora do mercado de trabalho, sem
nenhuma perspectiva de inserção na sociedade.
No tocante aos tipos possíveis de perpetradores, são vários tipos, os maridos, ex-maridos, namorados, ex-
namorados, pai, irmão, filhos, mas o que mais prevalece são companheiros ou ex-companheiros dessas
mulheres. Mas para Marta, entrevistada 2, há umas figuras coadjuvantes que estão nessa história de
violência, para ela, figuras como pai, mãe, irmãos ou até pessoas da igreja ajudam a perpetuar a violência
quando dizem que é normal bater, xingar, que “não é nada demais”.
Segundo os dados disponibilizados na tabela (Tabela 3), acerca dos perpetradores, evidenciam-se 37, no
total, de marido/companheiros como possíveis agressores, prevalecendo a maior incidência no ano de 2019,
em que se contabilizou 18. Já em relação ao ex-companheiro, a tabela mostra o total de 24, e a sua maior
incidência é no ano de 2021, com 17. Esses dados evidenciam como a sociedade normaliza a violência
contra as mulheres, como o ato de bater, xingar e violar as mulheres é visto como normal.
Tabela 3 - Possíveis agressores

Agressor Ano
2019 2020 2021 Total

Marido/Companheiro 18 8 11 37
Ex-Companheiro 4 3 17 24

Namorado (a) 3 4 0 7
Pai/Mãe 4 2 4 10
Filho (a) 1 0 0 1
Irmão (a) 12 8 0 20

Nora/Genro 1 0 1 2
Neto (a) 1 1 1 3

Desconhecido 1 0 0 1
Vizinho 0 0 2 2

Fonte: Dados disponibilizados pelo Centro de Referência da Mulher- CRM (2022).

Falas como “você tem que aguentar” desvalorizam a dor da mulher, e a sociedade tem que olhar as mulheres
não só como vítimas, mas como sujeitos dotados de direitos, que merecem viver sem violência, sem estar
em uma relação que a destrua, que a viole de alguma forma. Como observado nos dados, os ex-
companheiros ainda prevalecem como tipos de agressores, por não aceitarem o término do casamento, da
relação, que está fadada a acabar com a autoestima da mulher, dos filhos e da sua vida, em permanecer
em situação de violência para sustentar essa relação. Segundo Machado (2010), os homens consideram
seus atos como correção no contrato que eles fizeram com as mulheres, colocando que as mulheres não
fizeram o que deveriam ter feito em relação aos filhos ou de ser amigáveis e já que são casadas devem se
comportar como tal



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Como observado, o CRM parte de uma escuta dessas mulheres com uma equipe multiprofissional,
psicólogos, assistentes sociais, e há toda uma articulação da rede para que essa mulher resolva outras
questões objetivas, como em relação à separação, à saúde e à assistência jurídica. Além dos grupos, que
a partir deles elas conseguem relatar sobre a violência vivenciada, se os temas perpassam sobre esses de
violência, assim, as reuniões podem ter diversos temas, como relacionadas ao emprego, renda e entre
outras temáticas.
Ainda, a questão da articulação é bem deficitária, segundo as duas entrevistadas, existe um diálogo com a
DEAM, mas poderia ser melhor, e com a promotoria é pouco, além de que muitas mulheres relatam que não
são bem atendidas na DEAM. Sendo a articulação melhor com o Juizado especializado e a Patrulha Maria
da Penha, como dos eixos de promoção, CRAS, UBS, mas ainda é deficitário e a maioria das mulheres vai
uma vez e não volta, por questões mais objetivas, como localização, falta de transporte público no município
e com quem deixar os filhos.
Além disso, a falta de um plano de políticas para as mulheres dificulta a continuidade dos serviços, onde irá
recorrer, ou cobrar para que, de fato, essas articulações aconteçam, e que as mulheres possam ter acesso
a outros direitos que poderiam ser articulados, caso existisse um plano.
Hoje, Mossoró por exemplo, tem o conselho de políticas para as mulheres, está desativado. Eu não conheço
o orçamento para as políticas das mulheres, os atendimentos as mulheres vítimas de violência, também
estou aqui a pouco tempo. Não existe um plano, então assim. O plano resolve alguma coisa? Não é que
resolve, mas ele divide as responsabilidades em mais ou menos, poder esperar ou poder cobrar de alguém
tal coisa (Marta, entrevista concedida em 14/03/2022).
Outras questões objetivas, como o deslocamento para essas mulheres até o CRM, ter dinheiro para
transporte, caso existam vagas para curso que priorizem essas mulheres, são demandas que a entrevistada
coloca, será que essa mulher vai ter o dinheiro do transporte? Se ela tem, ela tem onde deixar os filhos?
Vai existir uma rede de apoio para essa mulher? Então, são questões de demandas prioritárias, que muitas
das vezes as políticas públicas não abrangem, bem como pensar no perfil socioeconômico dessas mulheres,
como elas irão atrás de apoio psicológico, assistencial se não tem acesso ao básico? São questões a serem
pensadas, bem como o acesso a cursos e empregos e as políticas para isso.
A falta de um conselho de direitos das mulheres para deliberar, ver a questão de orçamentos, avaliar as
políticas, tendo participação da sociedade civil, como de um plano de políticas, dificulta a criação de outros
segmentos que poderiam estar envolvidos nessa articulação, como as UBS e os CRAS.
Então, muitas questões fazem com que as mulheres não procurem o CRM para esse atendimento
multiprofissional que poderia ajudá-las a saírem das relações com seus agressores ou as ajudar com as
articulações, mas pelo medo de ir denunciar e ser encaminhada ao CRM, a locomoção e a falta de outras
políticas de promoção a essas mulheres, que mesmo que elas estejam nas diretrizes, mas com a falta de
OPM para articular e monitorar essas políticas, com capacidade e corpo técnico qualificado, elas não são
executadas como deveriam.


Considerações Finais

Como exposto, ainda há muito no que se avançar em políticas públicas, principalmente em um Organismo
de Políticas para Mulheres (OPM) municipal em Mossoró. Observando que a OPM municipal para existir e
ser executada, vem de uma OPM estadual fortalecida e robusta, com corpo técnico qualificado, equipes



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para induzir os munícipios para implementar políticas públicas, com capilarização e intersetorialidade dessas
políticas, tendo assim uma equipe que se destaca e se interessa nesse segmento. Como visto, em Mossoró
não possui um Organismo de Políticas para mulheres, não tem também um plano de políticas para as
mulheres atualmente, como foi colocado que até em 2018 possuía, como também possuía um conselho de
direitos das mulheres que atualmente está desativado.
Parte da precarização do Centro de Referência da Mulher-CRM vem dessa não articulação de monitorar as
políticas públicas que existem em Mossoró, já que até 2018 não se disponha de uma OPM municipal para
articular e monitorar como estaria essa política e os serviços especializados existentes. Além disso, como
foi constatado, os dados são incipientes, já que os levantamentos não são feitos anualmente sobre a
violência doméstica no município, parte dos dados levantados foram do CRM, através dos atendimentos
que diminuíram substancialmente na pandemia, mas as subnotificações de casos aumentaram.
Além disso, pudemos constatar através da entrevista que a violência mais preponderante é a violência
psicológica, que pode levar a todas as outras, como colocado no relatório do Fórum Brasileiro de Segurança
Pública (FBSP, 2021) — que a violência psicológica leva as mulheres a perderem seus empregos e, além
de afetarem sua autoestima, não conseguem mais fazer suas tarefas básicas, porque a violência já as
corroeu. Pensando nisso, buscamos trazer a discussão de gênero enquanto construção social, e o sexo
enquanto simbólico e cultural, pode-se dizer que a questão da violência doméstica, desse poder que os
homens exercem com as mulheres, parte dessa construção de que os homens podem bater, enquanto
castigo, por não ter feito algo da maneira que eles queriam ou exigiram. Parte dessa dominação patriarcal
existente é preponderante para que os homens achem que mandam nas mulheres, que existe essa
dominação para com as mulheres, chegando ao ato da violência.
Os possíveis tipos de agressores, como observado nos dados obtidos, são os companheiros e os ex-
companheiros que violentam as mulheres, mas há destaque para outros familiares que compreendem esse
ciclo, que para uma das entrevistadas exercem um papel na vida dessas mulheres que pode contribuir para
que, muitas das vezes, elas permaneçam nessa relação, como forma de que teriam que aguentar isso para
que o casamento prevaleça. Isso, como colocado por Machado (2000), compreende as relações de gênero
e esse contrato conjugal que as mulheres fazem com seus parceiros, como forma de que parece natural
aceitar isso, e que eles têm direitos iguais na sociedade, e que assim deveria ser no casamento, direitos
esses que são de proibir a mulher de estudar, de sair, de ter uma renda de controlar a mulher, como se ele
fosse dono dela nessa relação.
Então, compreender esses atendimentos perpassa não apenas como as mulheres são atendidas no CRM,
mas de que maneira esse fluxo irá continuar e como os profissionais poderão dar o direito ao acesso a
outras questões a essas mulheres, a escuta, o acolhimento, os grupos, como o acionamento das redes, e
as ações são feitas, mas não basta só isso, existem demandas que muitas vezes as políticas públicas, que
não são feitas a longo prazo, não conseguem efetivar, há de existir uma continuação nesses serviços para
que, de fato, essas mulheres consigam ter mais do que atendimentos, mas que suas questões objetivas,
como renda e acesso aos outros direitos aconteçam na prática.


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Revista NAU Social - v.14, n.27, p. 1423 – 1440 Ago. 2023 / Dez. 2023 |

ISSN - 2237-7840

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