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O campo de políticas públicas na encruzilhada: aproximações teórico-
metodológicas entre os estudos críticos, o pragmatismo e a gestão social
The policy field at the crossroads: theoretical-methodological approaches between critical policy
studies, pragmatism and social management
Janaina Lopes Pereira Peres 1
Rosana de Freitas Boullosa 2
Luiz Fernando Macedo Bessa 3
RESUMO
Experiências públicas relevantes vêm sendo amplamente desperdiçadas pelo campo
de estudos em políticas públicas – tanto pelos estudos racionais quanto pelos estudos
críticos. Partindo dessa observação, este artigo desenha caminhos teórico-
metodológicos alternativos, que revelam a importância de tais experiências para o
campo e instigam a construção de novos instrumentos capazes de conferir-lhes
visibilidade/inteligibilidade. A partir de uma experiência estética situada,
possivelmente invisível/ininteligível em caminhos de pesquisa tradicionais,
entrecruzamos os estudos críticos, o pragmatismo deweyano e a gestão social, por
meio da articulação de cinco categorias: (i) argumento, (ii) reflexividade, (iii) público,
(iv) prática e (v) experiência estética. Lançadas à encruzilhada – o lugar da dúvida
desencadeadora de investigações e ações –, essas categorias têm o potencial de
deslocar as fronteiras do campo (e das estruturas epistemológicas que o sustentam),
ampliando-o e pluralizando-o. Ao exemplo do que faz Exu – que engole de um jeito,
para cuspir de forma transformada – construímos um “olho” que permite ver e
interpretar experiências repletas de significação política, cultural e estética.
Concluímos que temos muito a aprender com essas experiências e constatamos,
também, que sair da encruzilhada pressupõe ao menos três grandes deslocamentos:
1) ressignificar o conceito de ‘políticas públicas’, interpretando-o como fluxo
multiatorial/multissensorial, a partir da gestão social; 2) adotar uma perspectiva de
análise sociocêntrica, em detrimento da tradição estadocêntrica, a partir dos estudos
críticos; e 3) conferir centralidade à experiência, religando policy e politics, a partir do
pragmatismo deweyano.
Palavras-chave: políticas públicas; estudos críticos; pragmatismo; gestão social;
1 Doutora e mestre em Desenvolvimento, Tecnologias e Políticas Públicas pelo Programa de Pós-Graduação em
Desenvolvimento, Sociedade e Cooperação Internacional - PPGDSCI, do Centro de Estudos Avançados Multidisciplinares
- CEAM, da Universidade de Brasília. Professora Substituta do Departamento de Gestão de Políticas Públicas da
Universidade de Brasília (FACE/UnB). E-mail: janainaperes@gmail.com
2 Doutora em Políticas Públicas, pela Università IUAV di Venezia (Veneza, Itália), com pós-doutorado Sociologia
Pragmática, na École des Hautes Études en Sciences Sociales - EHESS (Paris, França). Professora Associada II do
Departamento de Gestão de Políticas Públicas (GPP), da Universidade de Brasília (UnB) e professora do Programa de
Pós Graduação em Sociedade, Desenvolvimento e Cooperação Internacional (PPGDSCI/CEAM - UnB). E-mail:
zanzanzan@gmail.com
3 Doutor em Géographie Humaine et Organization de l’Espace pela Université Paris 1 (Panthéon-Sorbonne), com pós-
doutorado em Governança Urbana e Metropolitana, no Institut de Recherche pour le Developement (IRD/ Universidade
Paris 7, França). Professor do Departamento de Gestão de Políticas Públicas e Coordenador do Programa de Pós-
Graduação em Desenvolvimento, Sociedade e Cooperação Internacional (PPGDSCI/CEAM), ambos da Universidade de
Brasília - UnB. E-mail: lfmbessa@gmail.com
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experiência estética.
ABSTRACT
Relevant public experiences have been largely discarded by the Brazilian Policy field
– both by the mainstream and by critical policy studies. Based on that observation, this
article opens alternative theoretical and methodological paths, which reveal the
importance of such experiences for the field and instigate the construction of new
instruments capable of giving them visibility/intelligibility. Departing from a situated
aesthetic experience, possibly invisible/unintelligible through traditional research
paths, we intertwine Critical Policy Studies, Deweyan Pragmatism and Social
Management, by articulating five categories: (i) argument, (ii) reflexivity, (iii) public, (iv)
practice and (v) aesthetic experience. Thrown at the crossroads - the place of doubt
that triggers investigations and actions -, these categories have the potential to
displace the boundaries of the field (and the epistemological structures that support it),
expanding and pluralizing it. Following the example of what Exu does - swallowing in
a way, to spit in a transformed one - we build an “eye” that allows us to see and interpret
experiences full of political, cultural and aesthetic significance. We conclude that we
have a lot to learn from these experiences and we also find that leaving the crossroads
presupposes at least three major dislocations: 1) re-signifying the concept of 'public
policies', interpreting it as multiatorial/multisensory flows, with the help of social
management ; 2) adopting a sociocentric perspective, to the detriment of the
statocentric tradition, based on critical policy studies; and 3) giving centrality to
experience and reconnecting policy and politics, based on Deweyan pragmatism.
Keywords: public policy; critical policy studies; pragmatism; social management;
aesthetic experience
1. Introdução
As construções e reflexões que apresentamos neste artigo1 têm como ponto de partida a identificação de
uma lacuna de pesquisa no campo brasileiro de políticas públicas: a invisibilidade-ininteligibilidade de
experiências sociocêntricas, que faz com que sejam amplamente desperdiçadas. Um desperdício que
atribuímos, em grande medida, à dinamicidade de tais experiências e à sua forte dimensão estética, que
dificultam sua interpretação, sobretudo devido à falta de um instrumental teórico-metodológico e analítico
que auxilie vê-las e compreendê-las dentro do campo de estudos em políticas públicas. Trata-se de uma
dificuldade que é maior na abordagem racionalista em políticas públicas (ARPP), mas que também existe
no âmbito dos estudos de natureza oposta, filiados aos chamados ‘estudos críticos em políticas públicas’,
que, embora valorizem outras racionalidades, ainda não dispõem de um arcabouço teórico-metodológico
para a análise de experiências estéticas em movimento, como, por exemplo, o movimento hip hop.
Esta lacuna, intuída no decorrer de uma experiência estética e constatada na literatura (XXX, 2020),
instigou-nos a repensar as bases epistemológicas e os métodos de pesquisa tradicionalmente empregados
neste campo. Passamos a ver o movimento hip hop como parte dos fluxos de políticas públicas e a
experimentá-lo de dentro, em lugar de pensá-lo à distância. E fizemos isso por meio de uma pesquisa
situada e implicada, que exigiu a adoção de uma postura reflexiva, reconhecendo a arrogância dos nossos
próprios “olhos” e os limites e preconceitos que estruturam nossas formas de pensar; de uma postura
decolonial, reconhecendo que o objeto de pesquisa é, também, sujeito produtor de argumentos; de uma
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postura de ouvinte ativo (e atento), para não incorrer no risco de reter apenas as palavras que desejamos e
para escutar os silêncios; e de uma genuína postura de aprendiz (Peres, 2020).
Isso porque os processos de reconhecimento e de valorização de experiências de outra natureza nos
parecem centrais nas discussões sobre a ampliação e a pluralização do campo das políticas públicas,
sobretudo em contextos de crises e de complexificação dos problemas públicos. Há pelo menos duas
décadas, cientistas brasileiros e estrangeiros vêm denunciando, enfaticamente, o descolamento entre o
pensar e o fazer políticas públicas, os problemas sociais e as soluções estatais e vêm advogando por uma
compreensão ‘para além do Estado’, para além do ciclo de políticas públicas, da racionalidade
exclusivamente instrumental ou de dicotomias como ‘público-privado’ e ‘estado-sociedade’. As
transformações, porém, ainda são tímidas e fragmentadas. Além de disciplinares e pouco transversais, boa
parte dos estudos ainda padecem de baixa densidade reflexiva e analítica, baixa capacidade dialógica e
pouco se beneficiam dos conhecimentos acumulados (Souza, 2003; Farah, 2018; Boullosa et al., 2019, no
prelo).
Por um lado, as pesquisas crescem quantitativamente e vêm incorporando novos temas e atores,
mobilizando teorias e modelos diversos2. Por outro lado, ainda são raros os trabalhos dedicados a
compreender e a interpretar uma ampla gama de iniciativas e associativismos sociais – complexos, com
contornos difusos, comumente informais e não institucionalizados – que transbordam a noção de
‘movimento social’, mas que conformam “sociedades em movimento” (Peres, 2020). Mais do que isso, seria
precipitado dizer que a pluralização e a diversificação em curso tenham influenciado, significativamente, os
modos de pensar, de fazer e de avaliar políticas públicas, na prática. Nesse sentido, são muitos os desafios
e acreditamos que, por meio de um exercício simultaneamente científico, simbólico e sensível, os
ensinamentos do ‘Movimento hip hop da Ceilândia’ contribuem com a construção de um “olho” menos
arrogante (Frye, 1983), de interpretações que articulem elementos tradicionais dos processos de políticas
públicas com outras experiências, igualmente potentes.
Não há saída única da encruzilhada, assim como não há caminho único para a inovação na arena pública.
Os caminhos que compartilhamos aqui, porém, pressupõem três deslocamentos principais: 1) problematizar
o conceito hegemônico de ‘políticas públicas’, conferindo-lhe outros significados e ampliando-o a ponto de
que possa ser compreendido como fluxos abertos, dinâmicos, assimétricos e, necessariamente, multiatoriais
e multissensoriais; 2) abandonar a perspectiva exclusivamente estadocêntrica, ainda dominante no campo
de estudos em políticas públicas, e adotar uma perspectiva radicalmente sociocêntrica, o que significa
conferir centralidade às iniciativas sociais, articulando-as com experiências estatais e do setor privado; 3)
Tornar os processos de políticas públicas mais públicos e mais políticos, compreendendo que dados,
evidências, técnicas, instrumentos, etc., são indissociáveis do político (dos espaços de poder, conflito e
exclusões) e da política (do conjunto de instituições e de práticas que constroem significados, organizam a
coexistência humana e conferem qualidade pública e qualidade estética aos processos). Mas, afinal, como
uma experiência estética sociocêntrica se publiciza e se politiza no campo das políticas públicas?
Com esta pesquisa não linear, multidisciplinar, implicada (Boullosa, 2019) e centrada na experiência,
defendemos a produção de conhecimento-no-contexto (Fischer, 2016) e em movimento, o que só pode se
dar no decurso de experiências: no experimentando, pensando, interpretando, discutindo. É o desafio
imposto pela encruzilhada. Metodologicamente, buscamos ‘saídas’ por meio do recurso à tríade peirciana3
(Peirce, 2005), à utilidade social do conhecimento4 e à noção de “ciência como coisa viva” (Ferrara, 1986/87,
p. 02). Não como proposta de ruptura com o campo de políticas públicas, mas de problematização daquilo
que se convencionou considerar, historicamente, ‘conhecimento científico’ – pretensamente objetivo, neutro,
racional, verdadeiro, universal e, geralmente, muito distante da experiência estética. Partimos,
abdutivamente, de uma experiência estética que tem o potencial de gerar dúvidas, despertar a curiosidade
e desencadear processos de investigação, para produzir conhecimento ‘feito de mundo’ (Sousa Santos,
2008). Indutivamente (a partir da situação), escolhemos nossas categorias teórico-analíticas,
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problematizamos a escala da experiência, desbravamos o terreno, escolhemos os materiais de pesquisa e
construímos os instrumentos necessários à explicação de nossas ideias, tudo isso entremeado da
experiência de sociabilidade, integração, pertencimento, negociação, aproximação e persuasão no plano
empírico.
Interpretamos, esteticamente, a experiência vivida e desembocamos, dedutivamente, na generalização de
tais ideias, concluindo que quanto mais diversas e numerosas forem as experiências públicas
visíveis/inteligíveis dentro do campo das políticas públicas, maiores as chances de que impregnem o campo
com outros saberes, práticas, formas inovadoras de fazer, racionalidades e normatividades. Na relação entre
a prática, o olhar e a interpretação, entre cadernos de campo e registros fotográficos, entre escutas e trocas
de informação, entre conversas e trocas de afeto, construímos um percurso de pesquisa e ecoamos,
também, uma experiência. Por esse caminho, não buscamos respostas a uma pergunta predefinida, mas
nos engajamos em situações de políticas púbicas que emergiram da Praça do Cidadão, da Ceilândia
(Distrito Federal – DF) e do movimento hip hop, que, (re)situados, problematizados e interpretados nos
fluxos de políticas públicas, têm muito a ensinar a todas e todos nós.
2. Da experiência estética à experiência pública
[crônica de uma experiência – Parte I5]
***
Fui ‘n’ vezes à Ceilândia e ainda me lembro da primeira. E, se é teimosa na memória, é
porque não é banal. Sair do plano piloto é como romper uma bolha. Não uma bolha
efêmera, de ar, mas uma bolha de parede espessa, de textura lisa, de cor branca. Toda
lisa e branca. À metáfora do muro, prefiro essa, da bolha, que não separa só duas porções
de terra, mas que encarcera o ar, que tem um dentro e que tem um fora. E que não é
trivial, porque quando se fura a bolha, despenca-se no outro e tal queda-livre é sempre
incômoda. Porque o outro tem outra cor, tem outro cheiro, outro gosto. Lá tem outro ritmo.
Não é meramente outro lugar, é, também, outro tempo. Ensopada de suor e de
academicismo, quando vou à Ceilândia - de vidro escancarado à poeira, ouvindo Cultura
FM - sempre me vem Milton Santos, o geógrafo-brasileiro. Negro. Brasileiro. Geógrafo-negro-
brasileiro, que pensou muita coisa e, também pensou a distância. Pensou a falácia
da distância.
Pensou a tirania da distância, pra ser mais exata.
Talvez tenha até pensado a Ceilândia, à distância.
Parece que o problema da distância entre a brasília-plano e a não-brasília-Ceilândia não
é problema geográfico. Tampouco é puramente político. É problema que reflete que a
distância é sociotirânica.
Naquela sexta-feira à tarde, enquanto eu ia me engarrafando rumo à Ceilândia, o sol ia
se pondo. E tem um ponto em que o céu vira espelho da terra laranja que margeia a via
estrutural. É tudo metade seco e metade mágico. Era setembro. Engarrafada, pensando
essa Ceilândia-distante pelas letras de Milton Santos, arrombei a bolha e caí em cheio na
Praça da Bíblia. No P Norte. O Jamaika me disse que, em 1979, o P Norte era só terra,
poeira e malandro... O P Norte virou rap. Primeiro, com o GOG, que cantou o P Norte
naquela letra quilométrica de ‘Brasília Periferia’. Não fosse quilométrica e não tivesse a
‘Parte II’, não cabia tanta periferia. Lobo do Asfalto também cantou a quebrada. E até os
Racionais, à distância, lá do Capão Redondo, deram um Salve pro P Norte. Mano Brown,
Edi Rock, KL Jay e até Mv Bill já foram à Ceilândia. Acho que Milton Santos, não... Nunca foi
à Ceilândia e não sabia nada do P Norte. O Japão sabe. Não o país, o rapper... Eu sei que
ele sabe, porque quando ele me falou do P Norte, estávamos dentro do setor. Em uma
mesa de bar, do Fluminense, mesmo ele sendo flamenguista... no meio do P Norte,
olhando pra Praça da Bíblia. Falou do P Norte, do Fundão, da Expansão, da viela 17, da
esposa, da mãe e do irmão, que é padre.
Olha, acho que não dá, mesmo, pra pensar a Ceilândia só pela cabeça de quem não
esteve com o pé lá... a Ceilândia é que tem que se pensar e ser pensada pela pele do
Japão e de quem mais tenha a Ceilândia cicatrizada. As cidades têm que ser pensadas
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pelas cicatrizes, por essas marcas que não são só de cor, porque até a cor pode ser lisa,
mas a cicatriz não. Cicatriz tem textura. E a Ceilândia toda tem textura. Lá, nada é
branco, nada é claro, nada tem borda definida. Tem uma aspereza distintiva. Tem quina.
É o oposto do liso.
A pele preta do Japão também. E a do Jamaika. E a do Kabala e de toda essa gente que,
todo dia, muda de pele e de nome. Se reinventa. A pele da Wemmia, da Rayane e a pele
da Realleza, que brilha no sol nascente. A do GOG. E a do Mano Brown. Tudo pele viva,
carne viva. Voz com textura. Tudo boca que profere palavra áspera.
É a cicatriz que implode o mito do moderno.
Na Ceilândia é tudo crespo. Foi por isso que, quando perguntei pro Japão o que ele
achava dos muros invisíveis ou imaginários que dividem “cidades constitucionalmente
indivisíveis”, a resposta foi um tiro [...que furou a bolha e dissipou a mágica, enquanto o sol
a essa altura já ia longe]:
“Só são imaginários pra quem acredita em imaginação. O muro é real, ele existe. E ele
segura. E ele expele. E se você chega perto, ele te expulsa”.
Tailândia. Ceilondres.
Quando eu entro na Ceilândia, pela Hélio Prates, meus teóricos também já vão longe.
À medida que nos inserimos em uma comunidade acadêmica, sobretudo quando engajados em programas
de pós-graduação, absolutamente preocupados com a cientificidade de nossas pesquisas – com as provas
de verdade – e com as métricas de publicação e de avaliação estabelecidas por agências estatais; ávidos
por encontrar conexões entre teoria, método e prática; ansiosos em descrever, compreender, problematizar
e analisar objetos de pesquisa e determinados a responder perguntas pré-formuladas, acabamos
destituindo, inevitavelmente, as experiências científicas de sua dimensão estética. Promovemos,
equivocadamente, a oposição entre objetividade científica e subjetividade, entre fato e valor, em busca da
‘coleta’ de ‘dados objetivos’ a que chamamos ‘evidências’ e em busca da filiação a corrente de pensamento
já consolidada. Desenhamos e projetamos, na maioria das vezes, um caminho dedutivo ou indutivo e, atados
a ele e a um cronograma, construímos uma resposta a uma pergunta de pesquisa - previa e intensivamente
pensada (por nós ou por outros) –, que carrega consigo, fatalmente, o apagamento de tantas outras
respostas possíveis.
Por esse caminho, seguimos – linear e sequencialmente – como se progredíssemos. Atestamos nossa
racionalidade, justificamos nossos métodos com o argumento de que, se seguido por outros, levará ao
mesmo lugar. Para não nos perdermos, submetemos nossas investigações a modelos já validados e, assim,
raramente vemos “Ipásia”, a cidade de Ítalo Calvino (1990) em que os símbolos falam outra língua, diferente
da que conhecemos. Talvez por isso fracassamos enquanto cientistas sociais (Fischer, 2016), insistimos em
respostas velhas e simples, para problemas novos e complexos e porque construímos um cientificismo que
hierarquiza saberes e, consequentemente, desperdiça experiências (Majone, 1989; Sousa Santos, 2002).
Há mais coisas, porém, que cristalizam (e aprofundam) a distância entre as ciências (sociais) e a realidade
(social), como a reificação das políticas públicas e a seletividade do olhar, que só podem ser superadas por
meio de estudos cada vez mais multidisciplinares, transversais, interseccionais e decoloniais.
Há muita ação política sendo elaborada no interior do mundo social e muita experiência sendo vivida
cotidianamente. Ações e experiências ainda não decodificadas pelos campos científicos, experiências
sequer visíveis, mas essenciais à transformação do mundo social (Quéré; Terzi, 2015) e à transformação
dos próprios campos. E é essa premissa que nos incita a propor que as políticas públicas não sejam
interpretadas apenas como fenômenos objetivos (Capano; Giuliani, 1998) – normas, textos escritos,
documentos, instrumentos, programas, etc. – mas como fluxos multiatoriais (Boullosa, 2013; 2019) que se
transformam continuamente a partir da combinação de diferentes elementos. Em lugar da rejeição e da
substituição do termo ‘política pública’ – como propuseram Lascoumes e Le Galès (2012) –, o que propomos
é que ele seja ampliado e que se torne permeável a novos sentidos. Alinhados com um conjunto diverso (e
crescente) de autores6, propomos uma interpretação das ‘políticas públicas’ para além de sua materialidade
ou da realidade objetiva que desencadeiam.
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Esse salto, porém, do estudo da política pública como objeto (coisa) para seu estudo enquanto fluxo incerto,
conflituoso e muitas vezes desordenado – que não pode ser visto, tocado ou predeterminado e não segue
um percurso linear ou totalmente previsível – exige, como instiga Calvino (1990), o abandono de significados
já consolidados em mentes cientificamente formatadas. Depende da disposição para traçar outros caminhos
e permitir que as histórias sejam contadas por outros narradores, como reivindicaram os rappers Baco Exu
do Blues (2018), em ‘BB King’7 e Renan Inquérito (2010), em ‘Poucas Palavras’: “(...) vou ser breve / Se a
história e nossa, deixa que nóis escreve”. São apelos que trazem a perspectiva periférica das batalhas – de
rima, de poesia ou de breaking – para o centro do fazer científico e que nos lançam às encruzilhadas.
Este é apenas um dos exemplos que ilustram que o movimento hip hop – aqui entendido como “experiência
pública” (Peres, 2020) – configura um campo estético e um campo de possibilidades, em que conflitos,
tensões e violências são traduzidos em formas simbólicas (Shusterman, 1992) e em disputas agônicas e
legítimas (Mouffe, 2007), pela sistematização e pela produção de narrativas, de memórias, de significados,
de argumentos e de valores. Uma batalha é resultado de um fazer-junto, configura uma situação, no sentido
deweyano (Dewey, 1908; 2007), porque só emerge na e da interação e porque seu sucesso depende, em
grande medida, da capacidade crítico-reflexiva e da capacidade de articulação entre argumentos diferentes
e, comumente, divergentes. Trata-se de um espaço de negociação (uma arena simultaneamente pública e
política), que problematiza a “monocultura do saber” e os privilégios epistemológicos que marginalizam,
silenciam, excluem ou liquidam outros conhecimentos (Sousa Santos, 2008, p. 154). Cotidianamente, os
atores e as práticas vinculadas ao movimento hip hop jogam tudo na encruzilhada e deixam que algo novo
nasça.
Parece-nos, assim, cada vez mais urgente mirar ao revés (Boullosa, 2013; 2019), adotar outros critérios e
materiais de pesquisa, em busca de explicações plurais para um mundo social cada vez mais diverso e
complexo. Afinal, da mesma forma que o mundo sociopolítico é muito maior do que aquilo que conseguimos
ver e do que conseguimos representar por meio de categorias, conceitos, signos e símbolos, o mesmo se
dá no mundo das políticas públicas, exigindo de nós, cientistas deste campo, o esforço de desenvolver
instrumentos interpretativos que abarquem materiais de pesquisa voláteis e mutáveis – como são, por
exemplo, as narrativas, os argumentos, as memórias, os imaginários sociais, os valores, as expressões
artísticas, a oralidade e a corporeidade, as práticas socioterritoriais, as situações indeterminadas, as
experiências estéticas. Trata-se de um esforço compatível com a ideia de estudar, “(...) em vez da separação
entre sujeito e objeto, o objeto que é sujeito; em vez da separação entre observador e observado, o
observador na observação; em vez da separação entre o pensar e o agir, a interatividade entre ambos no
processo de investigação” (Sousa Santos, 2008, p. 141, grifo nosso).
Os estudos críticos em políticas públicas nos inspiraram a estudar situações que não conseguíamos ver
enquanto percorríamos trilhas já abertas por outras teorias em políticas públicas. Ainda assim, interpretar
políticas públicas como fluxo de aprendizagem e estudar uma ‘experiência pública’ como parte desse fluxo
exigiu a construção de um caminho próprio, que compusemos a partir de três escolas de pensamento.
Filiamo-nos aos critical policy studies8 e, sobretudo, às viradas argumentativa (Fischer; Forester, 1993) e
interpretativa (Lipsky, 1980; Jennings, 1983), para advogar pela inclusão de discursos e falas, de textos e
análogos de textos (Taylor, 1971) e de argumentos (Fischer, 2016) aos fluxos das políticas públicas,
conferindo centralidade, respectivamente, às palavras (Majone, 1989), aos significados (Yanow, 2016) e aos
valores (Boullosa, 2019). Trata-se de um importante deslocamento, porque permite a passagem do
estadocentrismo ao sociocentrismo, o que nos afasta da compreensão das políticas públicas como a ação
do estado (Lasswell, 1951) e nos direciona a compreensões mais fluidas e amplas, relacionadas a fluxos de
conversas multivocais (Fischer, 2016).
Por um lado, o deslocamento é instigante, porque nos força a reconhecer que situações de políticas públicas
objetivas são indissociáveis de percepções subjetivas (e que ambas são geradoras de conhecimento e de
normatividades); por outro, impõe grandes desafios, sobretudo em termos metodológicos e analíticos.
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Assim, para preencher algumas lacunas e avançar, mais confortavelmente, recorremos à filosofia
pragmatista, em contraposição à filosofia analítica e à visão positivista que marcaram o nascimento e o
desenvolvimento do campo de estudos em políticas públicas, desde Lasswell (1951). E escolhemos o
pragmatismo deweyano como principal fundamento teórico-metodológico, porque Dewey (1908; 1927; 2010)
permite abarcar, para além das verdades ou do pretensamente real, tudo o que é imaginado9, incitando-nos
a compreender políticas públicas como processos de busca e não como objetos imutáveis. Por fim, nos
filiamos à Gestão Social, somando-nos aos esforços de cientistas de políticas públicas preocupados em
expandir e pluralizar o campo, para além da teoria política empírica e da orientação positivista voltada para
resultados10, e que buscam, por meio dessa pluralização, inová-lo. Há terreno fértil para tais inovações, no
Brasil, dentro11 e fora da Academia. As encruzilhadas teórico-metodológicas e as encruzilhadas práticas
têm o potencial de gerar essa energia centrífuga que empurra as fronteiras do campo e permite emergir, em
seu centro, novas experiências, possivelmente públicas.
Neste texto, apresentamos uma composição de cinco categorias teórico-metodológicas que julgamos
essenciais à construção da encruzilhada, estabelecendo as bases para a observação de um campo (e de
uma sociedade) em movimento. Para apreender tal movimento, recorremos às noções de fluxos de políticas
públicas (Boullosa, 2013) e de situações de políticas públicas (Dewey, 1908; 2010; Marzadro, 2019),
entendendo que um ‘problema público’ não é resultado de uma situação objetiva, mas da
identificação/definição coletiva de situações indeterminadas, mais tarde designadas como problemáticas,
por públicos afetados e comovidos (direta ou indiretamente) e por meio de processos normativos,
discursivos, argumentativos, interpretativos e, consequentemente, políticos (Dewey, 1927; Blumer, 1971).
Nesse sentido, os fluxos de políticas públicas se estabelecem a partir da identificação de lacunas entre o
que é e o que deveria ser e se constituem a partir das ações e práticas estatais e não estatais, em busca de
um equilíbrio – sempre provisório. A provisoriedade deste equilíbrio, somada às incertezas inerentes à
contemporaneidade, garantem o continuum de situações e transações12 a que chamamos fluxo.
[crônica de uma experiência – Parte II]
***
E eu sinto o peso do nome. CEI-lândia. Pesa como barril de água. E tudo o que eu achava
saber, fica gasto. Puído. Esgarçado. Na Ceilândia não tem verdade simples (ela existe?).
Nada está dado (e onde está?). Se Sei-lândia se escrevesse com S, seria outra coisa?
E se a Campanha tivesse sido de Erradicação da Intolerância? E se, por engano, não
tiverem erradicado só os ‘invasores’ lá do plano, mas, também, toda a possibilidade de
inovação?
A essa altura eu já estava me inclinando no banco pra encostar a cabeça no concreto
quente, bem ali, entre-tempos: entre o momento em que nasceu a RUAS e o voguing no
coreto. Praça do Cidadão.
Eu sei que rua, coreto e cidadão, quando se juntam em linhas, constroem uma imagem
quase idílica. E que seja... porque paira, na praça, uma liberdade de estar (e de ser, talvez)
que beira mesmo o bucolismo.
Pra mim, que trago o estereótipo da CEI-lândia tatuado na retina, a praça é como um
enclave. Ali, me esparramo. Quero esticar as costas no calor do banco que não é meu.
Quero esperar 2010 voltar, pra ouvir as três palmas que precederam o ‘pé na porta’. Quero
sorrir pra quem está e pra quem passa, como quem diz: “eu te vejo”. E sinto meu olho na
bolinha do olho do outro. E me escuto. Parece ser libertador e,
simultaneamente, inútil.
Cair da bolha é quase um golpe seco, que pode rachar o concreto. Porque a frustração
também é a fissura do hábito. E é na brecha, no defeito, no conflito, na rugosidade da
cicatriz, que moram outras cidades possíveis. É, também, paradoxalmente, pelas brechas
que se costuram os espaços frouxos, o choro frouxo, os problemas frouxos – fios frouxos,
prontos para serem amarrados. A brecha é pública. A praça é pública. Praça e Brecha:
pacificamente violentas, continuamente em guerra.
Porque a paz só é, enquanto negociada, batalhada. Igual a democracia.
O rapaz, encostado na parede (bem na minha frente), barganhou com cautela a metade
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do banco. Abaixou, no radinho, a voz do Sabotage – “um bom lugar a gente constrói com
humildade”. E foi se chegando.
Nesse brasil e nessa Ceilândia, o homem estranho (e preto) quando se aproxima traz a
latência do medo. Mas, latente mesmo é o preconceito, da minha geração branca, que
achou que rap era música de bandido. E que não percebeu que, de novo, na história da
Ceilândia não tem verdade simples. Tem disco de rap que moveu multidão. Tem cara feia
nos encartes, taco de beiseball, tem a morte, tem as chamas. Por trás dos discos, tem
Cláudio Raffaello Serzedello Corrêa Santoro – branco e ‘do plano’ –, pelejando pra
aguentar o peso do rap e o peso dos significados que atribuímos aos nomes.
Selado, no concreto da praça, tem medo e cansaço. Tem corpos prescritos. Mas também
tem arroubo, tem ímpeto e empuxo.
Um ritmo tipicamente plural embalou a sexta-feira. Passavam das 19 horas,
horário de Brasília.
Dentro do ‘Jovem’, tinha classe. Fora, também. O garoto do lado, com o olhar receptivo,
tentou me vender algo. Acenei, timidamente, um ‘não’. Depois, me ofereceu seda. Depois,
me pediu um isqueiro. Depois, se questionou (em silêncio) ‘pra quê’ eu ‘era’, ali. E me
ignorou na conversa entre homens. E me ignoraram, também, os que riscavam a quadra
de basquete, dançando sem bola e sem cesta.
No coreto, atrás de mim, inclinavam-se pescoços curiosos com o Voguing e com as
complexas performances dos garotos sobre altíssimos saltos. E os saltos bastavam, para
que se impusesse o debate tácito. Sob o olhar desconfiado do rapaz mergulhado no ‘meu’
banco e no seu próprio som – misturado com mil outros – e sob os olhares indiferentes de
outros grupos, reunidos ao redor de outros bancos, todo mundo se enxergava, se
estranhava, se reconhecia, se julgava, se aceitava. Tão diferentes. Tão rotulados.
Diante do cenho franzido e do olhar silencioso do rapaz ao meu lado, cortei o ar:
“Difícil, ãhn?”, indicando os corpos masculinos de salto alto, que se dobravam em
movimento. Na opacidade do ar, espesso de conflito, minha voz ecoou artificial, fora de
lugar, quase invasiva. Ele respondeu, quase sorrindo: “muito...”.
Há, na cidade, mil conflitos latentes.
Mas há, também, na praça, mil pulsões. Há arte, antes do que nunca.
E há muita dúvida! O que acontece quando se escreve no muro que separa?
Lá, acontece tudo, inclusive nada.
3. Na encruzilhada: re-localizando as bases teóricas do campo de políticas públicas
Nas encruzilhadas da vida, busque seu centro e
encontre a saída - Mãe Stella de Oxóssi (2017)
Enquanto boa parte dos estudos em políticas públicas se esforça para traçar as distinções entre politics e
policy, delimitar fatos e evidências e produzir um tipo de conhecimento capaz de aumentar a expertise,
aperfeiçoar a tecnocracia e imputar cada vez mais racionalidade ao policy process, experiências estéticas
interseccionais, como a que engendrada pelo movimento hip hop da Ceilândia/DF, insistem em nos jogar
na encruzilhada. Como sugere Vaz (2011), em consonância com os ritos associados a Exu – “que [enquanto
enugbarijó] inventa a vida enquanto possibilidade, engole de um jeito para cuspir de outra forma totalmente
transformada. (...) cospe marafo na encruza”, inventando novas possibilidades.” (Rufino, 2016, p. 61) –, urge
um ritual antropofágico e periférico, para que outras versões da história – muitas vezes marginais - também
possam ser narradas. E vale enfatizar que não fazemos referencia a uma periferia exclusivamente
geográfica, mas às experiências que se encontram na periferia de nossos campos visuais, na periferia das
análises de políticas públicas.
Ao mesmo tempo em que as encruzilhadas representam a interseção de caminhos, são também expressão
da sobreposição de territorialidades e temporalidades – vida, morte e renascimento. Se Exu é, no candomblé
e na umbanda, o multifacetado Orixá orientador dos caminhos, o princípio explicativo dinâmico, o tradutor
de mundos e o gerador de movimentos (Rufino, 2016), a encruzilhada, interpretada a partir dos saberes da
diáspora africana (que tanto inspiram o movimento hip hop), representa um “campo de possibilidades”, em
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que tempo e espaço (copresenças) se fundem, dando origem ao potencial transformador de Exu (idem, p.
59). A metáfora nos parece tão potente quanto a experiência vivida, porque ativa a reflexividade crítica,
possibilitando a transformação de uma situação em outra, a recomposição das gramáticas e a abertura
saídas, como defende Mãe Stella de Oxóssi (2017).
Exu do Blues, me recompus, queimei a encruzilhada
Não me enquadro em nada, não me enquadro a nada
Meu renascimento não será em um quadro,
Será numa praga
(...)
Sou o que coexiste nas parábolas e parabólicas
Morte simbólica, moral da história
Pivete, nós é o renascimento da poesia de escoria!
Trecho da música Tropicália, do rapper Baco Exu do Blues13 (2016)
A encruzilhada carrega consigo a simbologia do encontro entre opostos e desponta como lugar onde
“cidadãos-artistas” (BOAL, 2009, p. 91) podem transmutar energias negativas em positivas. Trata-se de uma
oposição que se evidencia em diversas letras de rap – como na música ‘Encruzilhada’, do grupo de rap
‘Cirurgia Moral’ ou na letra de ‘Do pó ao pó’, do Dj Jamaika, ambos da Ceilândia (DF). Nesse sentido, a
metáfora nos interessa não como representação de dicotomias, mas como ponto de encontro de diferentes
e, em termos teórico-metodológicos, interessa-nos, ainda, como “operadora de linguagens e de discursos”
e como um “lugar terceiro”, gerador de significados e de pluralidades (Martins, 1997, p. 25). Interpretada
pelas lentes do pragmatismo deweyano, a encruzilhada pode ser entendida, também, como lugar da dúvida
situada: a própria situação geradora de processos de investigação, de ação e de aprendizagem (Dewey,
1908; 2007).
O encruze triplo que propomos nesta pesquisa convida a mirar três caminhos ‘ao revés’, em busca de
maneiras práticas de alargar as fronteiras do campo de estudos em políticas públicas e de pluralizar as
vozes que nele ecoam, contribuindo, também, para sua democratização. O desenvolvimento de outras
formas de pensar e de agir costuma exigir rupturas paradigmáticas e o recurso aos estudos críticos em
políticas públicas (sobretudo argumentativo e interpretativo), ao pragmatismo (sobretudo deweyano) e à
gestão social (em sua vertente brasileira) justifica-se pela oposição que fazem a paradigmas científicos ou
doutrinas filosóficas responsáveis por fazer “com que algumas experiências pareçam sem importância,
alguns pensamentos sejam impensáveis e algumas questões de pesquisa potencialmente frutíferas pareçam
indignas de investigação” (Green, 2014, p. 80).
Mais do que o desafio de abertura a outros valores, outras estéticas, outros estilos de vida e outras
experiências, encaramos essa proposta como um desafio ético-democrático, que nos parece fundamental
no campo de estudos em políticas públicas: o desafio de “olhar para os outros humildemente e escutá-los,
em lugar de julgar arrogantemente aquilo que desconhecemos, dando peso igual ou maior àquelas vozes
que foram comumente silenciadas ou desrespeitadas no passado (...)” (Green, 2014, p. 88) e que seguem
silenciadas e desrespeitadas no presente. Urge repensar o papel das políticas públicas estatais, instando-
as a criar um ambiente cultural em que as minorias sociológicas se sintam estimuladas e encorajadas a se
engajar em torno de problemas que as afetam e comovem direta e indiretamente, a constituir comunidades
de investigadores e arenas públicas, desencadeando processos coletivos de aprendizagem. Não se trata
apenas de reconhecer as experiências cotidianas (que se publicizam em seu decurso) como partes
essenciais do fluxo de políticas, mas de criar um campo de visão menos arrogante14 (Frye, 1983), capaz de
incorporar novos sujeitos, linguagens, práticas, corpos, estéticas e saberes e de instigar esses sujeitos a se
reconhecerem, reflexivamente, como partes ativas deste fluxo.
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2. As categorias que constroem a encruzilhada: escolhendo saídas multidisciplinares
Chega de festejar a desvantagem / E permitir que desgastem a nossa imagem / Descendente negro
atual meu nome é Brown / Não sou complexado e tal / Apenas Racional / É a verdade mais pura /
Postura definitiva / A juventude negra / Agora tem voz ativa
Trecho da música ‘Voz Ativa’, do álbum ‘Escollha seu caminho’ (RACIONAIS, 1992)
2.1 O caminho dos estudos críticos em políticas públicas
O campo das políticas públicas é nosso lugar de fala e os estudos críticos em políticas públicas – mais
conhecidos por seu nome em inglês ‘Critical Policy Studies’, em função das parcas traduções e da chegada
tardia dessa ‘escola de pensamento’ no Brasil – constituem nossa base de interpretação coletiva: sãos os
lugares onde nos situamos e a partir de onde vemos, interpretamos e narramos situações de políticas
públicas.
Os estudos críticos, enquanto corrente de pensamento pós-positivista, emergiram no escopo da
efervescência intelectual dos anos 1970-80, iniciando um alargamento das fronteiras do campo, a partir de
trabalhos como os de Taylor (1971), Callahan e Jennings (1983), Majone (1989) e Fischer e Forester
(1993)15. Associando-se a outras bases teóricas, metodológicas e analíticas, estes autores problematizam
a tradição científica positivista (e seus valores16) e o conceito de tradicional de ‘políticas públicas’,
reconhecendo que múltiplas racionalidades convivem e se combinam neste campo, para além da
racionalidade econômico-instrumental.
Com as Policy Sciences, Lasswell (1951, p. 03) defendia a importância de se imputar mais racionalidade às
decisões e de se cultivar a técnica, lamentando a escassez ou os altos custos de “talentos altamente
treinados”, ao mesmo tempo em que afirmava, paradoxalmente, que sua proposta de policy sciences era a
de uma ciência das políticas públicas da democracia, inspirada, nas palavras do próprio Lasswell (1971), na
abordagem pragmatista. A filiação, porém, é polêmica. Tanto a criticidade (ou não) quanto o espírito
democrático do pensamento de Lasswell têm alimentado debates importantes, por exemplo, no âmbito da
revista Critical Policy Studies (Torgerson, 2019; Zittoun, 2019; Boullosa, 2019b) e das Conferências
Internacionais sobre Políticas Públicas (ICPPs). Aqui – para além das incongruências entre as noções de
‘democracia’, em Lasswell (1927; 1951) e em Dewey (1998 [1937; 1939]) –, é indispensável salientar a
diferença entre o que o autor intenciona (ou escreve) e as consequências práticas que a obra enseja: o que
os leitores/intérpretes fazem dela (Boullosa, 2019b).
Isso explica, por exemplo, por que a pluralização do campo de políticas públicas, nos Estados Unidos ou no
Brasil, ainda é limitada: a participação restringe-se às fases iniciais do chamado ‘ciclo das políticas públicas’
e, mesmo quando ocorre, os processos de construção de soluções ainda estão direcionados a problemas
pré-definidos por pequenos grupos de poder e/ou pautados em boas práticas e em modelos importados de
outras realidades, o que resulta em processos de baixa densidade democrática. Um caminho pouco afeito à
radicalização da democracia e ao estímulo de sua dimensão criativa, como defendido por Dewey (1998
[1937]). Nesse sentido, experiências como a do movimento hip hop (dentre tantas outras que emergem,
diariamente, das margens) nos auxiliam a pensar a democracia como um processo diário e não como um
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fim e nos auxiliam a conceber a constituição de uma “inteligência pública coletiva” (idem, p. 05) que seja
multivocal e trans-racional.
Assumimos como primeiro passo teórico-analítico, para a construção de um “olho” menos arrogante, o
reconhecimento do argumento e da reflexividade como elementos essenciais dos fluxos de políticas
públicas.
2.1.1 Argumento
Com a “virada argumentativa”, Fischer e Forester (1993) propõe a substituição da prova ou da verificação
científica (identidade com a verdade) pelo argumento17; a substituição da racionalidade objetivista e
instrumental por uma razão prática, também entendida como um raciocínio-no-contexto. Em movimento
análogo, Taylor (1971), já vinha advogando pela substituição de documentos legislativos e de textos de
autoria do Estado ou de qualquer autoridade específica por outros ‘textos’ ou análogos de textos, que
poderiam ter sido construídos a partir de múltiplas interpretações e por múltiplos públicos (Yanow, 2016).
Trata-se de uma virada bastante significativa, porque reconhece que os significados (quem os constrói e
como são construídos) não apenas influenciam no desenho de políticas públicas, mas condicionam a própria
definição de situações e, consequentemente, de problemas públicos, determinando, quais dados e quais
evidências embasarão o policy process. Nesse sentido, os critical policy studies recobram a importância que
Wittgenstein (1968 [1921]) havia conferido à linguagem – técnica ou experimental/cotidiana – e a trazem
para o centro do policy process, reconhecendo que a palavra e os significados atribuídos a ela nunca
constituem um meio neutro.
Assim, as políticas públicas passam a ser vistas – por cientistas comprometidos com essa corrente de
pensamento – como resultantes de argumentos práticos que desencadeiam ações políticas. Com isso
argumentos, interpretações de argumentos, deliberações críticas (formais e informais) e valores (Majone,
1989) são trazidos para dentro dos fluxos de políticas públicas, estimulando a emergência de novos quadros
ou lógicas de investigação (Dryzek, 2016), alternativos ao positivismo e ao racionalismo, como são os casos
das análises discursivas (Dryzek, 1989), interpretativas (Callahan; Jennings, 1983), narrativas (Roe, 1994),
argumentativas (Fischer; Forester, 1993), feministas (Hawkesworth, 1988), decoloniais, etc. Em comum,
estes métodos rejeitam a existência de um mundo rígido, fechado ou acabado, rompem com a ideia de uma
política pública despolitizada e defendem a compreensão dinâmica e processual tanto do fazer científico
quanto do fazer política pública.
Os argumentos nos interessam enquanto categoria teórico-metodológica, porque contém a crítica à
separação entre fato e valor e porque o recurso a essa “mescla complexa de afirmações factuais, de
interpretações, de opiniões e de avaliações” (Majone, 1989, p. 63) tem um importante potencial
democratizador, tanto no âmbito do ensino-pesquisa como no âmbito das práticas sociais e profissionais.
Além disso, a categoria dialoga com a “virada epistemológica” proposta por Sousa Santos (2002), ao
combater a ideia de que a emergência de novos movimentos sociais, ações coletivas plurais, associativismos
múltiplos, articulações e colaborações não institucionalizadas, etc. – ou “experiências públicas” (Peres,
2020) – sobrecarrega o sistema político democrático ou dificulta a vida dos formuladores, analistas ou
gestores de políticas públicas, “como se a crise da democracia ou do governo representativo se devesse ao
excesso de democracia” (Fischer et al., 2016, p. 07).
Advogamos o contrário. Nossa tese é a de que essas emergências, as experiências engendradas por essas
sociedades em movimento – mesmo quando aparentemente fracassadas e mesmo quando apagadas,
deslegitimadas ou fragmentadas – são, precisamente, o que oportuniza novos espaços de aprendizagem e
de reflexão, tanto teórica quanto prática, abrindo caminho para os avanços democráticos e para a inovação
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com equidade e justiça social. Isso porque os argumentos que produzem (no âmbito de seus textos e
análogos de textos, no âmbito de suas ações e suas práticas, no âmbito de sua oralidade e corporeidade),
além de servirem como importantes fontes e materiais de pesquisas conduzidas no âmbito acadêmico
servem, também, como referencial prático para novas experiências. Nesse movimento, constroem-se as
teias (ou matrizes) de argumentos, inclusive divergentes, que modelam ações concertadas, melhorando,
potencialmente, a qualidade da argumentação política. Quando escutamos os argumentos dos outros,
ultrapassamos os limites de nossa própria linguagem e nos inserimos em processos que Fischer (2016)
chama de ‘deliberação prática’.
É impossível dissociar o martelo do golpe. Ainda que concordemos que “a política pública é feita de
linguagem” (Majone, 1989, p. 01), essa afirmação não guarda nenhum automatismo ou relação inexorável
com ser crítico ou mesmo com ser democrático. Do mesmo modo, o mero recurso a arcabouços teórico-
metodológicos interpretativos ou críticos, a aplicação de metodologias dialógicas e colaborativas ou a
mobilização de atores não estatais não implicam, necessariamente, no abandono de orientações
tecnicamente administrativas ou politicamente conservadoras, porque nem a criticidade nem a reflexividade
são características inerentes ao sujeito (ao ator, ao cientista, ao analista ou ao gestor) e tampouco são
habilidades ou competências que, uma vez desenvolvidas, podem ser naturalizadas. Derivam, na verdade,
de processos contínuos e permanentes, de medir-se e de examinar-se. Processos por meio dos quais nos
livramos “do hábito de pensar a democracia como algo institucional e externo (...) [para] perceber que a
democracia é uma realidade somente quando é de fato um lugar-comum de vida” (Dewey, 1998 [1939], p.
06). É nesse sentido que Dryzek (2016) também sugere radicalizar a virada argumentativa em políticas
públicas, estendendo-a até que alcance as estruturas democráticas.
2.1.2 Reflexividade
Se a reflexividade é uma condição para a criticidade e para o desenvolvimento de estudos críticos (Fischer,
2016b, Braun, 2016, Zittoun, 2019), ela é, também, condição essencial para a própria ruptura e para sair da
encruzilhada. Para isso, porém, é necessário que a reflexividade seja transversal e não se restrinja a apenas
uma ou outra dimensão da vida ou das pesquisas. Ao mesmo tempo em que a reflexividade emerge como
requisito para o combate aos ‘epistemicídios’ e aos ‘métodos extrativistas’, como denunciado por Sousa
Santos (2008), ela é um instrumentos para a superação de dicotomias como sujeito-objeto, razão-emoção e
para a passagem da pesquisa aplicada à pesquisa implicada, como defende Boullosa (2019).
Entendemos a reflexividade como o exame crítico (contínuo e constante) do nosso próprio modo de olhar e
como meio de aprendizagem. É a capacidade de refletir no curso-da-ação, pensar enquanto fazemos
(Schön, 1983); significa questionar-se e problematizar-se, compreendendo que nossas práticas (inclusive as
de pesquisa) também são modeladas por contextos, discursos, argumentos e práticas/experiências
anteriores. Aqui, enfatizamos, porém, o “exercício de reflexividade coletiva” ou social, como proposto por
Cefaï (2013, p. 11), para além da ideia de “consciência reflexiva” (Mead, 1899, p. 371). É por meio desse
exercício coletivo que nos afirmamos como públicos de nossos próprios problemas, reconhecemos
argumentos e perspectivas divergentes dos nossos e nos confrontamos, ressignificando nossas próprias
crenças e nossos próprios quadros de valores.
Da mesma maneira que a reflexividade ativa processos de construção de públicos, de investigação e de
ressignificação, ela também catalisa processos ativos e criativos de problematização do mundo e, assim,
catalisa a imaginação/criação de novas realidades (Mendonça, 2013). Esses processos têm o potencial de
produzir a energia ou a força centrífuga necessária para a ampliação das fronteiras do campo de políticas
públicas e de seus quadros valorativos (Boullosa, 2019). É a reflexividade que baliza nosso compromisso
ético com a comunicação aberta e com a participação inclusiva e irrestrita, compreendidas como a única
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forma defensável de ensinar, estudar, pesquisar, formular ou analisar políticas públicas. A reflexividade
emerge, então, como possibilidade de sair melhor da encruzilhada e de construir um caminho por meio do
qual possamos dar coerência interna e relevância social às nossas ideias.
2.2 O caminho do pragmatismo
Diante das possibilidades abertas pelos estudos críticos e diante de seus limites, nossa segunda proposta é
a de olhar para o pragmatismo deweyano18 do século XIX e para suas releituras francesas (Cefaï, 1996;
2013; Frega, 2016; Quéré e Terzi, 2015). O recurso ao pragmatismo justifica-se em termos teóricos,
metodológicos e epistemológicos, porque não apenas nos permite ressignificar a noção de público, como
nos permite ver práticas e conferir centralidade à experiência, em mais uma tentativa de superar a
fragmentação entre as dimensões social, econômica, política, cultural, estética, artística, etc., no campo das
políticas públicas. Recorrer ao pragmatismo tem, ainda, o intuito de preencher a lacuna aberta por Lasswell
(1971), entre o momento em que invoca Dewey como sua fonte inspiradora e o momento atual dos estudos
em políticas públicas, no Brasil, que pouco se inspiram na noção deweyana de experiência ou em seu
radicalismo democrático.
Propomos, assim, retomar essa tradição, a partir de três categorias: o público, a prática e a experiência
estética. Antes, porém, elencamos as características do pragmatismo a que nos referimos nesta pesquisa:
i) oposição ao “mito do que é dado” (Sellars, 1963); ii) oposição à ideia de verdade universal ou de uma
certeza científica determinística (Mead; 1899; James, 1907; Dewey, 2007; 2010); iii) foco na definição de um
objeto pelo conjunto de suas consequências ou efeitos (Peirce, 2005), conferindo centralidade às
possibilidades abertas pela ‘razão’ e não a suas restrições (Dewey, 1927); iv) reconhecimento do choque
(situação problemática) como gatilho de processos investigativos e reflexivos e, portanto, de produção de
conhecimento (Dewey, 1927; Cefaï, 2011; Quéré; Terzi, 2015); v) centralidade conferida ao
contexto/situação (Dewey, 2007); vi) centralidade conferida à experiência, a partir da qual se produz
conhecimento novo (Dewey, 1927; Cefaï, 1996; Quéré; Terzi, 2015); vii) defesa da dimensão procedimental
e experimental do conhecimento (Dewey, 1939) e valorização da dimensão impensada (e não menos sábia)
da cognição e das práticas ordinárias, em detrimento do intelectualismo e da admissão exclusiva do
conhecimento científico (Dewey, 1927; Shusterman, 2015); viii) compromisso inegociável com o
florescimento pessoal e coletivo, com a promoção de maior engajamento político autônomo e com o
aprofundamento de uma democracia necessariamente radical e criativa (Dewey, 1998 [1937]; [1939]).
O pragmatismo nos inspira a extrapolar o pensamento simbólico no campo das políticas públicas,
estendendo nossas análises ao pensamento sensível (Boal, 2009), por meio da mobilização das seguintes
categorias:
2.2.1 Público
Em termos gerais, Dewey (1927, p. 292) define o público como “um estado político”. Em termos específicos,
define-o como um conjunto de indivíduos que, suficientemente afetados (direta, indireta, física ou
emocionalmente), se veem implicados em uma situação problemática, a ponto de exigirem algum tipo de
reconhecimento ou a ponto de desencadearem algum tipo de ação, voltada ao teste de hipóteses ou à
construção de respostas coletivas. O autor não defende a ideia de um indivíduo onicompetente - que formula
políticas, julga resultados, conhece todas as demandas, encontra soluções ótimas e sabe colocá-las em
prática, mas sim que indivíduos, quando engajados em diálogos/confrontos públicos, de forma concentrada
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ou difusa, em espaços institucionais ou não, formam comunidades de investigadores, por meio de um triplo
processo de percepção-reflexão-investigação, que permite que encontrem, por si próprios, seus caminhos.
Tanto Dewey (1957) quanto Mead (1913) defendem, portanto, que indivíduo e sociedade nunca podem ser
considerados em isolamento, porque se constituem, mutuamente, por transações contínuas em
comunidades. A noção deweyana de público não emerge, portanto, da ideia de que é público o que é gerido
pelo poder público; é público o que é de todos; ou é público o que está localizado no espaço público.
Tampouco emerge da ideia de compartilhamento de argumentos racionais em espaços centrais,
institucionalizados e especializados, como na esfera pública de Habermas (1964). O conceito deweyano de
público dialoga com as noções de experiência e de democracia e nos leva a compreender que, para que
algo seja público, precisa ser gerado e moldado a partir do conhecimento situado, produzido-no-contexto da
experiência (Dewey, 1937), por aqueles mesmos indivíduos ou grupos que se reconhecem públicos de uma
situação problemática
A ‘Grande Comunidade’ deweyana é aberta, não orquestrada e não tem fronteiras nítidas (Dewey, 1927).
Nela, têm lugar experiências individuais e coletivas e, nelas, são construídos significados, são imaginadas e
testadas hipóteses, são construídas respostas/saídas para situações partilhadas, em busca de novos
equilíbrios provisórios. Pela ótica deweyana, as iniciativas sociocêntricas adquirem maior relevância, assim
como os praticantes ou ‘fazedores’ não estatais de políticas públicas e da vida cotidiana (Instituto, 2018).
Por essa mesma ótica, ganha centralidade a dimensão processual e projetual dos públicos, sempre em
processo de fazer-se. Do pragmatismo deweyano, emerge um público que duvida, que explora, que imagina,
que investiga, que experimenta, que age (Cefaï, 2013), que interpreta, que cria, que confere significados;
um público que, independentemente de sua formação técnica ou de sua expertise temática, tem inteligência
e capacidade de identificar situações problemáticas, engajar-se em torno do que considera um ‘problema’,
imaginar alternativas e buscar, coletivamente, novos equilíbrios – desde que haja condição adequada para
isso.
2.2.2 Prática
É quase óbvia a afirmação da importância e da centralidade do conceito de prática para o pragmatismo. Há
diferentes correntes sociológicas, porém, que se desenvolveram a partir da “virada prática” (Bourdieu, 1990)
e, mesmo dentro do pragmatismo, há diferenças importantes entre o pragmaticismo de Peirce (1905), o
empiricismo radical de James (1907) e o pragmatismo desenvolvido por John Dewey (2007). Como não há,
aqui, espaço para discutirmos tais diferenças, apenas justificaremos, brevemente, nossas escolhas.
Na encruzilhada ontológica-metodológica apontada por Frega (2016), escolhemos o caminho do método. E
recorremos às práticas como categoria analítica, por três razões principais. Primeiramente, porque permite
pensar uma matriz analítica que viabiliza o estudo de ‘experiências públicas’, dentro do campo de estudos
em políticas públicas. Em segundo lugar, porque a observação das práticas e das suas articulações, no
tempo e no espaço, permite a emergência de uma mesoescala de análise19, o lugar em que ações isoladas,
de atores individuais (situados na escala microssociológica), as ações de pequenos grupos e os
rebatimentos dessas ações em instituições, entidades e estruturas macrossociais se articulam, construindo
pontes entre o mundo da política cotidiana e o mundo da política institucional. E, em terceiro lugar, porque
possibilita um olhar radicalmente sociocêntrico (contra hegemônico), já que a noção pragmatista de prática
não hierarquiza práticas ou atores.
Assumimos, a partir de Frega (2016), que práticas são ações-em-contexto e que o recurso a essa categoria
enfatiza a autonomia individual e social e o potencial criativo da espontaneidade e do improviso contidos na
ação – permeando-a de outros valores. Trata-se, ainda, de uma forma de contraposição à noção de ação
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ou de atividade automática, muitas vezes preconizada pela teoria da escolha racional. No âmbito desta
pesquisa, a noção de prática conjuga quatro acepções, complementares e possivelmente sobrepostas: a)
prática como um agir plural (Crosta, 2009) e um saber-fazer coletivo/interativo (Quéré, 2016); b) prática como
uma tática (De Certeau, 1998), cujo desenrolar no tempo e no espaço elabora lugares teóricos, articula
lugares físicos e promove a passagem de um estado social a outro; c) prática como um mecanismo social
orientado à mudança (Gross, 2009); e d) prática como um uso do território e, nesse sentido, como produtora
de territórios (Crosta, 2009).
A quarta acepção mencionada justifica-se, principalmente, pelo fato de que o conceito de território de Crosta
(2009) – “território é o uso que se faz dele” - costura as noções de público e de prática, no campo das
políticas públicas, ao compreender práticas de uso como constitutivas tanto da política quanto da política
pública, são a prova dos territórios (por seu funcionamento) e, simultaneamente, a prova de seu caráter
público, inspirando-nos a interpretar o próprio policy process como um conjunto de práticas.
2.2.3 Experiência estética
Das categorias trabalhadas neste artigo, essa talvez seja a que encontra menos espaço no campo das
políticas públicas. Seja por ficar mais comumente restrita ao campo da Filosofia ou das Artes, seja pela
obsessão racional-tecnicista que predomina nas Políticas Públicas. Em ‘Arte como experiência’, porém,
Dewey (2010) associa a noção de experiência estética a tudo o que é ‘precioso’ e está impregnado de valor,
podendo ser compreendida como toda experiência que transmite/produz conhecimento, toda experiência
ativa. O que nos parece mais interessante é que, para Dewey (2010), o que diferencia a experiência comum
da experiência estética é sua dimensão afetiva. Assim, a ‘experiência estética’ pode ser definida como
aquela que nos afeta e comove ao ponto de nos fazer duvidar, imaginar outros caminhos possíveis, refletir
sobre hipóteses e nos inserir em uma comunidade de investigadores – é a experiência que nos afeta e
(co)move a ponto de nos tornar públicos.
Mais do que isso, recorrer a essa categoria no campo das políticas públicas nos permite compreender outras
culturas (para além da considerada oficial), outras formas de ser, de dizer, de fazer, de pensar, porque é
esse tipo de experiência que ativa nossas relações com o mundo. A experiência corporificada e impregnada
do social (Shusterman, 1992) tem maior potencial de ampliar nossos quadros cognitivos e de estimular. Por
meio delas, conferimos densidade política a nossas práticas, articulamos identidades e territórios – em
termos objetivos e subjetivos. Assim, a ‘experiência estética’ importa, por dois motivos principais: em primeiro
lugar, por convocar à missão de desnaturalizar o abismo que se abriu, historicamente, entre racionalidade e
afetividade; e, em segundo lugar, porque, por possibilitar transformações, reorganizações e ressignificações
de situações de políticas públicas. Ao atribuir qualidade estética às políticas públicas, atribuímos a elas a
qualidade de transmutar-se (Dewey, 2010), o que só é possível pelo fato de que o mundo em que vivemos
não está totalmente dado/acabado. A arte, portanto, é para Dewey (2010), a continuação da vida,
contrapondo-se à estética analítica bourdieusiana (Shusterman, 2015).
Vale ressaltar que a qualidade estética não é característica exclusiva de um objeto, de um produto, de uma
obra de arte. Não se encerra na crítica artística. Ao contrário, a qualidade estética pode permear qualquer
experiência e pode ser atribuída, também, a processos. Assim, mesmo o desinteresse pelo prazer estético
ou sua negação como valor, já são suficientes para a constituição de uma dimensão estética, que se revela
nos processos multissensoriais e reflexivos por meio dos quais somos capazes de restaurar os sentidos, os
significados, as necessidades, os impulsos e as ações (Dewey, 2010). No campo das políticas públicas,
portanto, a estética pragmatista nos abre inúmeros caminhos, seja pelo reconhecimento de uma dimensão
estética do policy process, seja por permitir transformações nos quadros de valorativos e nos quadros de
experiência. Afinal, a dimensão do sensível (Boal, 2009) costuma ser mais capaz de produzir choques “da
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ordem do sentir e do ressentir” (Cefaï, 2011, p. 75), de reorganizar “o sentimento de indignação” (idem, p.
68) e de permitir a transição a “julgamentos articulados” e à “formulação de boas razões para agir” (idem, p.
76).
Por meio dessas três categorias, justificamos nosso recurso ao pragmatismo clássico, não sem reconhecer
quão polêmica pode ser a escolha de uma teoria-método desenvolvida no início do século XX, nos Estados
Unidos, por homens brancos, para estudar experiências contemporâneas, situadas nas periferias brasileiras.
Embora John Dewey seja reconhecido como um dos pensadores que mais avançou no sentido de superar
as divisões entre teoria e prática e de promover a abertura a outros saberes, essa escolha sempre nos
colocará na encruzilhada. E, como saída, recorremos ao caminho da gestão social, em função dos valores
que este campo de conhecimentos e práticas reúne e de sua predisposição ao diálogo com epistemologias
tradicionais e emergentes, sejam estas fundadas em estudos decoloniais, feministas, culturais ou críticos,
de forma geral.
2.3 O caminho da Gestão Social
A Gestão Social é o caminho que nos fortalece, não apenas enquanto pesquisadores críticos do campo de
estudos em políticas públicas, mas enquanto pesquisadores brasileiros, do sul do mundo, engajados
pesquisas e com experiências socioterritorializadas. Assim, não adotamos, nesta pesquisa, a gestão social
como um conceito, mas como um paradigma (Cançado et. al., 2015) epistemológico e deontológico, que nos
permite repensar reflexivamente, por meio de argumentos e a partir de contextos específicos, a gestão de
públicos, de práticas, de experiências estéticas, de temporalidades-territorialidades. Nesse sentido, a gestão
social assume a função de tecnologia social de organização, de mediação e de tomada de decisão
idealmente dialógicas, horizontais, inclusivas, coletivas, transparentes, livres de coerção e comprometidas
com o desencadeamento de processos de aprendizagem e de coprodução (França Filho e Boullosa, 2015).
A escolha desse terceiro caminho guiou-se, sobretudo, pelos valores subjacentes ao paradigma da Gestão
Social. Aqui, fazemos referência, principalmente, aos valores da impermanência, o escrever a lápis
(Cançado, 2011), e da coletividade, o fazer junto (Boullosa, 2013), ambos embasados na defesa de que,
para que seja Social, a gestão (e seus valores) precisa ser diariamente reativada, refeita e re-imaginada
coletivamente. De forma análoga à tarefa que Dewey (1998 [1939]) atribui à democracia, parece-nos que a
tarefa atribuída à gestão social é a de sempre fomentar novas experiências, mais livres e mais humanas,
experiências que todos compartilhem e para a qual todos contribuam. Esse conjunto de valores, saberes e
práticas que conformam a gestão social (Silva Jr. et. al., 2008; Araújo, 2012) enfatiza a necessidade de
atenção a diferentes arranjos governativos e diferentes temporalidades-territorialidades que coexistem no
território brasileiro e que moldam, por exemplo, as experiências situadas nas periferias brasileiras.
Promover esse encruze responde, como mencionamos anteriormente, ao compromisso ético-político que
atravessa nossas pesquisas, que molda nossa postura e que reforça nosso papel, enquanto pesquisadores.
E, com relação às diversas ‘experiências públicas’ invisibilizadas e marginalizadas sistematicamente no
campo das políticas públicas, nosso papel é de reconhecê-las, abrir-lhes espaço e dialogar com elas,
promovendo espaços de reflexão teórico-prática, de aprendizagem mútua e de produção coletiva de
conhecimentos (e, consequentemente, de políticas públicas) mais plurais e democráticos. Pela via da Gestão
Social, é possível articular diferentes saberes, de construir uma agenda crítica de pesquisas, pensada
endogenamente e de baixo para cima (Schommer; Boullosa, 2011) e, principalmente, de encontrar essa rara
oportunidade de nos reinventarmos, reflexivamente.
Não nos referimos à Gestão Social como um dispositivo ou tecnologia de obtenção de consenso – como
pretendido pelo modelo habermasiano, por exemplo –, mas, sim, de compartilhamento e de cogestão de
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ideias, intenções, desejos, afetos, intuições, conflitos, etc., visando um novo entendimento, adequado a cada
realidade (França Filho; Boullosa, 2015). Pelo caminho da gestão social, percebemos quão porosas e
maleáveis são as fronteiras do mundo social, dos problemas públicos, dos conceitos ou dos valores que nos
empurram à ação. E, se são porosas e maleáveis, podem ser deslocadas e podem ser impregnadas, cada
vez mais, com novas vozes e com novos significados. Não se sai da encruzilhada se não por meio da
radicalização da virada argumentativa e da reflexividade e, consequentemente, por meio do fomento de uma
democracia mais radical e mais criativa.
Da encruzilhada inconclusiva a outros arranjos
Com este artigo, buscamos desenhar cruzamentos teórico-metodológicos alternativos, que permitam ver
políticas públicas como um fluxo multiatorial e multissensorial constituído, também, por experiências
estéticas sociocêntricas comumente invisibilizadas e/ou marginalizadas. Experiências como, por exemplo, o
movimento hip hop da Ceilândia/DF, que, vistas pelo “olho” menos arrogante, assumem o papel de
sistematizadoras e de produtoras de memórias e de narrativas; de sujeitos de investigação; de fontes de
argumentos e de saberes; de formadores de públicos e de campos estéticos que engendram novas
possibilidades. Isso exigiu, porém, o mergulho em uma experiência estética e o enfrentamento da
encruzilhada – ou seja, uma pesquisa situada e em movimento. A composição gerada pelo entrecruzamento
das cinco categorias que mobilizamos, portanto, é única, o que significa que, se outro pesquisador se colocar
na encruzilhada para ver e interpretar esta ou outras situações de políticas públicas, cada categoria –
argumento, reflexividade, prática, público e experiência estética – poderá emergir com diferentes
intensidades e diferentes entrecruzamentos, abrindo, portanto, outros caminhos.
Propusemo-nos, em primeiro lugar, a sofrer o choque estético de uma experiência potencialmente pública:
o movimento hip hop da Ceilândia/DF. Potencialmente, porque não é possível atribuir (de antemão) a
qualidade ‘pública’ a uma experiência, antes de experimentá-la. Se, por um lado, os entrecruzamentos aqui
apresentados nos abriram novos caminhos teórico-metodológicos; por outro, foi a experimentação prática
desse movimento estético (aqui traduzido em crônica) que nos colocou na encruzilhada e nos ensinou que
a ativação de táticas culturais – como o rap, o breakdancing, o grafite, as batalhas de Mcs20, etc. – são
importantes produtoras de argumentos e de reflexividde. Inspirados em Exu, engolimos o movimento hip hop
da Ceilândia, para cuspir uma ‘situação de política pública’ de uma forma não usual, mas igualmente válida
do ponto de vista científico.
Recorrendo às categorias de argumento e de reflexividade, derivadas dos Critical Policy Studies, situamos
esta pesquisa no do campo das políticas públicas e abrimos caminhos para abordagens sociocêntricas ou
multicêntricas. Recorrendo às categorias de público, prática e experiência estética, defendemos que políticas
públicas não são fenômenos objetivos e que, sobretudo por sua dimensão sensível e subjetiva, quando as
estudamos como se fossem meras ‘coisas’ – produtos ou resultados (quase-naturais) da intenção (ação ou
omissão) dos atores que detém poder – desperdiçamos inúmeras experiências. Ao contrário, quando as
estudamos enquanto fluxos impregnados de subjetividade, enquanto processos dinâmicos sensíveis,
percebemos que, em seu seio, podem coexistir múltiplas verdades, múltiplos argumentos e múltiplas
racionalidades (inclusive conflitantes ou divergentes). Abre-se, assim, espaço para a construção de um
arcabouço analítico que, ao invés de ser orientado ao problema, possa ser orientado, também, à experiência.
Recorrendo à gestão social, enfatizamos que, para ver/compreender o hip hop, a Ceilândia ou qualquer
outro sujeito de pesquisa, não é suficiente percorrer os pensamentos de quem nunca os experimentou.
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Isso porque todas as formas de ver e de interpretar são ações contingentes e provisórias, dependem do
ponto de onde vemos e de onde interpretamos. Mudam conforme muda nossa forma de pensar, de dizer,
de fazer, de julgar, de imaginar, de responder, de conferir significados, de participar. Por meio da construção
desse outro “olhar”, que se pretende empático, sem deixar de ser crítico-reflexivo, percebemos que há, no
mundo das políticas públicas, muito mais do que temos visto pelas lentes tradicionais, o que, por um lado,
nos abre uma nova agenda de pesquisa e, por outro, nos joga em novas encruzilhadas: afinal, que
experiências podem ser qualificadas como públicas, no campo das políticas públicas? Como podemos
avançar nossos estudos sobre a dimensão estética das políticas públicas? E mais: estando diante de uma
“experiência (potencialmente) pública” (Peres, 2020), como podemos estudá-la? Com que instrumentos?
Considerando quais materiais de pesquisa?
Acreditamos que a saída de qualquer encruzilhada precisa ser abdutiva: a partir da situação, da experiência.
Ao mesmo tempo em que as ‘experiências públicas’ conferem mais qualidade e densidade ao fluxo de
políticas públicas, elas suscitam (no público que se engaja a elas) outra consciência acerca de seu papel. O
paradoxo (positivo) que pudemos observar ao longo desta pesquisa é que, quanto mais os espaços de
participação política são constrangidos, em mais quantidade e com mais potência emergem experiências
públicas, nos centros e nas periferias do Brasil. Quanto mais a inventividade desaparece dos espaços
políticos e das esferas institucionalizadas de participação, mais ela pulsa nas praças, nos blocos, nos
coletivos, nas expressões artístico-culturais, como se fosse inerente às ‘experiências públicas’ uma função
política substitutiva. Advertimos, porém, que embora esse florescimento e essa pulsão pareçam (e possam
ser) positivos, o papel de ‘substituta da política (pública)’ não é, em absoluto, desejável e muito menos
requerido. Ainda que possam funcionar, isso costuma ocorrer à custa da liberdade, da juventude e do bem-
estar de muitos de seus praticantes/fazedores. Ao mesmo tempo em que podem ser experiências bem
sucedidas, seu sucesso pode refletir um mero cálculo de média. E, nesse caso, se um come quatro refeições
e o outro nenhuma, na média, cada um comeu duas.
A ruptura epistemológica – possível nas encruzilhadas – e o reconhecimento de que ‘experiências públicas’
(como o movimento hip hop da Ceilândia/DF) constituem parte essencial dos fluxos de políticas públicas
podem ser os primeiros passos para a ativação de novas experiências, para a pluralização do campo de
políticas públicas e para a construção de ‘saídas’ mais democráticas. Assim, cabe também a nós, cidadãos-
artistas e cientistas de políticas púbicas, torná-las mais visíveis, inteligíveis e viáveis. Será que é apenas “na
brecha, no defeito, no conflito, na rugosidade da cicatriz, que moram outros possíveis”? Precisamos refletir
sobre as condições de emergência e de permanência das ‘experiências públicas’ nos fluxos de políticas
públicas.
NOTAS
1. Neste artigo, apresentamos os resultados teórico-conceituais de uma pesquisa mais ampla, de natureza
fundamentalmente prática e implicada, desenvolvida entre os anos de 2016 e 2020, na Ceilândia/DF, com praticantes
do movimento hip hop, no âmbito do ‘Programa de Pós-Graduação em
XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX e do Grupo de Pesquisa
‘XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX’ Para uma discussão estendida e
mais detalhada das categorias aqui apresentadas e para conhecer os demais resultados, derivados, sobretudo, dos
planos metodológico e empírico, ver XXX (2020).
2. Sobre os diversos modelos e abordagens, ver: coalizões de defesa (Sabatier; Jenkins-Smith, 1993), equilíbrio
pontuado (Baumgartner; Jones, 1991), redes, comunidades e subsistemas ou subgovernos (Heclo, 1978; Howlett;
Ramesh, 1995; Haas, 1992; Ospina-Bozzi, 1998), teoria dos múltiplos fluxos decisórios (Kingdon, 2003) e dos sistemas
complexos (Lipsky, 1980; Grau-Solés et al.,2011); wicked problems (Rittel; Webber, 1973; Head, 2008); teoria da virada
argumentativa (Fischer; Forester, 1993) sociologia ação pública (Lascoumes; Lès Gales, 2012); teoria da mirada ao
revés (Boullosa, 2013; 2019).
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3. A proposta triádica de Peirce (2005) apresenta a experiência ou a Primeiridade fenomenológica como ponto de partida
(o lugar concreto a partir do qual o novo pode ser construído e as ideias podem ser produzidas); da experiência, passa-
se à Secundidade normativa (onde as ideias são explicadas, sistematizadas e testadas – em um processo indutivo),
para que, então, desemboque na Terceiridade metafísica (onde as ideias são generalizadas, podendo originar novas
teorias ou leis e, também, novas experiências). É interessante notar, ainda, que à Primeiridade peirciana é associada à
qualidade do ‘sentimento, da essência das coisas; à Secundidade, são associadas as ações como formas de luta, de
reação e de resistência; e, à Terceiridade, associa-se a representação e a aprendizagem, que só se desencadeia a partir
da relação triádica (Green, 2014).
4. A defesa da utilidade do conhecimento rendeu muitas críticas a John Dewey e a outros pragmatistas, acusados de
utilitarismo exacerbado. Dewey (2010, p. 496) respondeu a elas dizendo que, quando aponta o conhecimento como algo
instrumental, está defendendo que funcione como um instrumento “para o enriquecimento da experiência imediata,
através do controle da ação exercida por ele”, o próprio conhecimento, o que nada tem a ver com a produção de
conhecimento pautada na racionalidade instrumental e utilitária (meios-fins) defendida pelos positivistas.
5. Crônica escrita por XXXXXXXXXXXXXXXXXX, Plano Piloto/DF, em 08 de outubro de 2019.
6. Referimo-nos a nomes como Callahan e Jennings (1983); Capano e Giuliani (1998); Dryzek (1989); Fischer e Forester
(1993); Pier Luigi Crosta (2009) e Boullosa (2013).
7. Foda-se a imagem que vocês criaram / Não sou legível, não sou entendível / Sou meu próprio Deus, meu próprio
santo, meu próprio poeta / Me olhe como uma tela preta, de um único pintor / Só eu posso fazer minha arte / Só eu
posso me descreve. (Baco Exu do Blues, 2018).
8. Sobre os Critical Policy Studies e seus desdobramentos, ver Boullosa (et al., no prelo).
9. A imaginação não como capacidade de fantasiar a realidade, mas como capacidade de conferir sentido às sensações,
fazendo com o que o muno deixe de ser mera representação, para ser concebido como ininterrupta reconstrução. Para
Dewey (1910), imaginar é sinônimo de ver situações e objetos conhecidos sob uma nova luz.
10. A crença de que políticas públicas devem ser soluções racional e objetivamente ótimas, para solucionar problemas
identificados e delimitados por especialistas, levou Lasswell (1951, p. 07) a afirmar que “a batalha pelo método estava
ganha”, uma vez que não havia razões para duvidar do sucesso dos métodos quantitativos ou para não defender o
aumento da “racionalidade no fluxo de tomada de decisão” (idem, p. 03). Ainda que inúmeras abordagens, teorias ou
modelos tenham emergido de lá para cá, o Estado reina soberano, como principal ator de políticas públicas, juntamente
com a obsessão racionalista-instrumental, denunciada por Dryzek (1989).
11. Trata-se de um movimento ainda tímido e fragmentado, mas que tem sido capaz de incorporar importantes
discussões emergentes, tanto em termos teórico-metodológicos – buscando inspiração na teoria crítica e (com menor
frequência) na teoria pós-positivista – quanto em termos temáticos, incluindo nas agendas de pesquisa questões etárias,
raciais, étnicas, de gênero e de sexualidade, por exemplo (Farah, 2018).
12. Processos ativos de vida entre um organismo e o ambiente (Dewey, 2010).
13. Este rapper baiano, que, além de ter incorporado Exu a seu nome artístico e de ter dado ao seu primeiro álbum o
título ‘Esú’, desponta, na atualidade, por seu engajamento nas batalhas pela desconstrução-reconstrução de significados
e pela transformação de valores.
14. Para Frye (1983, p. 80) o olho arrogante é o que conecta todas as coisas e confere a elas significado, fazendo com
que aqueles que estão fora do campo de visão do olho arrogante, e, portanto, fora daquela rede de significados, sejam
desprovidos de qualquer sentido: “We fear that if we are not in that web of meaning there will be no meaning: our work
will be meaningless, our lives of no value, our accomplishments empty, our identities illusory.”.
15. Para uma visão mais detalhada acerca do desenvolvimento dos critical policy studies e sua chegada no Brasil, ver
Boullosa (et al., no prelo)
16. Privilegiam o fato em detrimento do valor; o conhecimento técnico e especializado em detrimento de outros saberes;
a racionalidade instrumental em detrimento de outras racionalidades; a objetividade e a pretensa neutralidade em
detrimento da subjetividade e da interpretação; etc.
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17. Para Fischer (2016), as conclusões científicas constituem argumentos que objetivam convencer outros cientistas.
Nesse sentido, as verdades (ou provas) científicas são sempre pautadas em decisões interpretativas, sociais e técnicas.
18. A escolha pelo pragmatismo de John Dewey não se dá à revelia do reconhecimento e da consideração das
importantes contribuições de William James (1907), sobretudo no que diz respeito ao seu conceito de verdade – que
associa o verdadeiro/válido ao útil – e George Mead (1899), sobretudo no que diz respeito à provisoriedade da verdade
e à noção de ‘outro generalizado’ (Mead, 1934).
19. Sobre a construção desta mesoescala, no campo das políticas públicas, ver XXXX (2020).
20. Acrônimo de Mestre de Cerimônias (Master of Cerimony), apresentador/cantor/artista que atua no movimento hip
hop.
Agradecimentos
Agradecemos, de forma muito especial, ao Grupo de Pesquisa “XXXXXXXXXX XXXXXXXXXXXXXXX
XXXXXXXXXXXXX XXXXXXX” (GPP/UnB), à Universidade de Brasília – pública e gratuita – e à Capes, cujo
financiamento permitiu a realização desta pesquisa.
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