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Inserção e institucionalização da política pública de economia solidária na
agenda governamental
Insertion and institutionalization of the public policy of the solidarity economy in the governmental
agenda


Rafael Junior dos Santos Figueiredo Salgado 1
Suzana Melissa de Moura Mafra da Silva 2
Teresa Júlia de Araújo Melo 3
Yuri de Lima Padilha 4
Alex Bruno Ferreira Marques do Nascimento 5




RESUMO
O artigo analisa a inserção de políticas públicas voltadas à economia solidária na
agenda governamental do Rio Grande do Norte e no Brasil, tendo como aporte teórico
a literatura relacionada às políticas públicas e o modelo de Kingdon (2014). Busca-se
entender quais fatores e motivos possibilitaram a emergência, implantação e
consolidação desta temática. A partir de uma abordagem qualitativa, os dados foram
coletados por entrevistas semiestruturadas com atores-chave do movimento da
economia solidária no contexto nacional e estadual. Utilizou-se triangulação e análise
de conteúdo, com auxílio do software AtlasTI©7. Os resultados indicam que a política
da economia solidária entra na agenda do governo federal a partir da pressão da
sociedade civil organizada aliado ao aparecimento de uma janela de oportunidade
com chegada ao poder de um partido permeável à política. O Governo Federal
assume protagonismo na coordenação federativa, no financiamento da política e na


1 Doutorando em Administração pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Mestre em Administração pela
Universidade Federal de Viçosa. Bacharel em Gestão do Agronegócio pela Universidade Federal de Viçosa. Foi bolsista
de Iniciação Cientifica pesquisando sobre temáticas relacionadas à politicas públicas, em especial, ao Programa de
Aquisição de Alimentos, Programa Nacional de Alimentação Escolar e Programa Nacional de Produção e Uso de
Biodiesel. Desenvolveu atividades no Centro de Referência da Cadeia de Produção de Biocombustíveis para a
Agricultura familiar e no Centro de Conhecimento em Bioenergia. Tem experiência nas áreas de Administração, com
ênfase em Administração Pública, e Economia Aplicada atuando principalmente nos seguintes temas: Administração
Rural, Administração Pública, Agricultura Familiar, Analise de Políticas Públicas, Desenvolvimento Rural e Teoria
Institucional. E-mail: rafa.salgad@gmail.com

2 Mestre em Administração (Universidade Federal do Rio Grande do Norte - PPGA/UFRN). Docente externa do curso de
graduação tecnológica em Gestão de Cooperativas - UFRN/INCRA. E-mail: suzanamelissa@gmail.com

3 Mestre em Administração pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Atualmente é docente do curso de
Administração da Universidade Federal Rural do Semi-Árido - UFERSA, docente externa do curso de graduação
tecnológica em Gestão de Cooperativas – UFRN/INCRA. Têm experiência e pesquisa nas áreas da Administração, com
ênfase em Administração Pública principalmente nos seguintes temas: Administração, Administração Pública, Análise
de Políticas Públicas, Economia Plural, Utilidade Social, Desenvolvimento Social e Relações de Trabalho. E-mail:
julia.melo90@gmail.com

4 Mestre e Doutor em Administração - PPGA/UFRN. Professor de Gestão Organizacional, Cooperativismo, Terceiro Setor
e Empreendedorismo - IFRN, Campus João Câmara. E-mail: yuri.padilha@gmail.com

5 Mestre e Doutor em Administração (Universidade Federal do Rio Grande do Norte - PPGA/UFRN). Professor Adjunto
- Univ. Federal de Campina Grande - UFCG; Programa de Pós-Graduação em Administração - PPGA/UAAC/UFCG;
e Unidade Acadêmica de Gestão Pública - UAGESP/CDSA/UFCG. E-mail: alexbruno.fmn@gmail.com

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indução de sua implementação no nível local (estados e municípios), entretanto, este
processo não ocorre de forma articulada e estruturada, culminando na implantação de
ações e programas isolados.
Palavras-chave: Economia Solidária; Política Pública; Agenda Governamental


ABSTRACT
The article analyzes the insertion of public policies focused on the solidarity economy
in the governmental agenda of Rio Grande do Norte and Brazil, having as a theoretical
contribution the literature related to public policies and the Kingdon´s model (2014). It
seeks to understand what factors and reasons allowed the emergence,
implementation, and consolidation of this theme. From a qualitative approach, the data
were collected through semi-structured interviews with four key actors of the solidarity
economy movement in the national and state context, which were analyzed through
content analysis using the AtlasTI © 7 software. The results indicate that the policy of
solidarity economy enters the agenda of the federal government from the pressure of
organized civil society combined with the emergence of an opportunity window
emerged on arrival of a political party permeable to politics. The Federal Government
assumes a leading role in federal coordination, in policy financing, and in its
implementation at the local level (states and municipalities); however, this process
does not occur in an articulated and structured manner, culminating in the
implementation of isolated actions and programs.

Keywords: Solidarity economy; Public policy; Government Agenda.


1. Introdução

Este artigo objetiva analisar a inserção de políticas públicas voltadas à economia solidária na agenda
governamental. Para tanto, avalia a trajetória da economia solidária no estado do Rio Grande do Norte e no
Brasil, buscando entender quais fatores e motivos possibilitaram sua emergência, implantação e
consolidação dentro de um contexto político-institucional.
No Brasil, a institucionalização de políticas públicas voltadas à economia solidária iniciou em 2003 e
prosseguiu, continuamente, por mais de uma década (NAGEM; SILVA, 2013). O que caracteriza um período
suficiente para análise de sua trajetória. Por outro lado, se comparada a outras temáticas, é uma política
recente o que possibilita acesso aos atores que participaram ativamente de sua construção.
A investigação proposta busca preencher lacuna empírica e teórica, pois são escassas as discussões acerca
da agenda governamental nas publicações sobre economia solidária. Capella (2012) evidencia que a análise
da formação da agenda governamental, a compreensão de como questões se tornam relevantes num
determinado momento, mobilizando esforços e recursos, são também questões importantes, porém ainda
pouco exploradas pela produção acadêmica em ciências sociais no Brasil. Verifica-se que os principais
trabalhos no âmbito das políticas públicas em economia solidária se concentram em dois eixos:

! Debatem o problema público e de que modo as políticas se configuram como alternativas a
sua resolução, bem como avaliam resultados (ARAÚJO; SILVA, 2005; BENINI, 2003;
POCHMANN, 2004; PRAXEDES, 2009).
! Remontam a trajetória, discutem sua institucionalização, mas não problematizam a agenda
(LECHAT, 2002; SCHIOCHET, 2011; SINGER, 2009).

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O artigo está estruturado para que o leitor possa compreender os elementos inerentes à inserção da política
pública de Economia Solidária na agenda governamental do Brasil e do Estado do Rio Grande do Norte.
Para isso, primeiramente será discutida a política da Economia Solidária propriamente dita, suas definições
e aspectos históricos; em seguida os postulados da teoria das políticas públicas, especificamente, como
uma política entra na agenda governamental, a luz do modelo teórico de Kingdon (2014); seguido pelos
procedimentos metodológicos; finaliza com as análises e considerações finais. Com essa estrutura é
esperado que o artigo contribua para clarificar os desafios e dificuldades de inserir a política da Economia
Solidária na agenda governamental e trazer da teoria avanços para o debate.

2. Políticas Públicas de Economia Solidária: definições e breve contexto

A institucionalização da Economia Solidária nas políticas públicas no Brasil tem por marco a criação da
Secretaria Nacional de Ações da Economia Solidária (SENAES) vinculada ao Ministério do Trabalho e
Emprego (MTE) no ano de 2003 (LOCKS, 2014; NAGEM; SILVA, 2013). A perspectiva da política, segundo
Singer (2004), era combater a exclusão social e o desemprego por meio da inclusão produtiva.
Pochmann (2004) remonta a emergência do tema no contexto nacional sistematizando elementos
socioeconômicos:

! Confluência de dois movimentos: (1) o aparecimento de um enorme excedente de mão-de-
obra qualificada, não imigrante rural e aculturado pela disciplina do trabalho sistêmico e (2) o
importante conjunto de militantes sociais críticos e engajados na construção de alternativas
antineoliberais de organização social e laboral no Brasil mediante a constituição de alianças
com segmentos excluídos da população;
! Crise de desenvolvimento, iniciada na década de 1980, que reduz o ciclo de industrialização
e gera estagnação da renda per capita, bem como instabilidade nas atividades produtivas;
! Aprofundamento de uma combinação perversa entre o ciclo de financeirização da riqueza e
a inserção passiva e subordinada do Brasil na economia mundial, o que o torna dependente da
produção e exportação de produtos primários, gerando efeitos regressivos no mercado de
trabalho nacional;
! Reestruturação produtiva.

Schiochet (2011, p. 443) define a economia solidária como "a apropriação coletiva dos meios de produção,
a gestão democrática pelos membros das decisões e deliberação coletiva sobre os rumos da produção, a
utilização dos excedentes (sobras) e, também, sobre a responsabilidade coletiva quanto aos eventuais
prejuízos da organização econômica". Os indivíduos envolvidos nessas iniciativas coletivas estavam, na
maior parte das vezes, em condição social de pobreza, portanto, estas práticas produtivas tinham caráter
emancipatório.
Singer (2009, p. 43) afirma que a criação da SENAES ocorre "num momento em que a economia solidária
estava entrando numa fase de crescente reconhecimento público e incipiente institucionalização". Antes da
existência da política pública, a economia solidária era fomentada majoritariamente por entidades da
sociedade civil mediante grupos de trabalho coletivos e cooperativos.
Diante das características específicas deste tipo organizacional e de seu modo de produção alternativo,
Benini (2003) afirma que isto implica um novo tipo de política pública para a questão de trabalho e renda
com princípios e valores alternativo aos dominantes.

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Quanto a análise institucional desta política, é importante reconhecer que são políticas de governo e que o
tema ainda não foi incorporado na agenda dos direitos (da cidadania) e dos deveres (públicos)
(SCHIOCHET, 2011), pois permanece como uma estratégia marginal em termos de foco de intervenção
governamental para a temática da geração de trabalho e renda no país, voltada fortemente para a via do
mercado de trabalhado assalariado (NAGEM; SILVA, 2013). Além disto, há um caráter intersetorial intrínseco
a esta ação pública o que torna mais complexa a análise de sua institucionalidade.

3. Políticas Públicas e Definição da Agenda

O primeiro momento do processo de elaboração da política se refere à percepção e definição de problemas,
quando um problema é identificado e ganha relevância política por meio da mídia e de outras formas de
comunicação política e social (FREY, 2000). Esta etapa se relaciona à ação de diferentes grupos de
interesse para inserir suas reivindicações nas agendas governamentais, denomina-se definição de agenda.
A agenda é a lista de temas ou problemas que agentes de dentro ou fora do governo estão prestando
atenção em determinado momento (Kingdon, 2014). Representa aqueles problemas e temas percebidos
como prioridades e escolhidos como foco de ação dos agentes governamentais (THEODOULOU, 1995). A
agenda enquanto priorização de temas e problemas a serem trabalhados por um governo (BEUBEL, 2006)
produz disputa entre os diversos atores que fazem parte do jogo político. É a particular arquitetura de poder
existente em cada situação que irá determinar quais os temas entrarão ou não para a agenda governamental
(SERAFIM; DIAS, 2012).
Segundo Pérez e Seisdedos (2006) e Kingdon (2014), podemos classificar os sujeitos envolvidos nesta
disputa em dois grandes grupos: os atores e os públicos. Os atores são aqueles que participam da definição
da agenda, conforme a sua relação com o problema. Os principais atores são o legislativo, o governo, a
administração pública, os grupos de interesses, os partidos políticos e os grupos de especialistas. Os sujeitos
sociais podem forçar os governos a inserir determinada questão na agenda, por meio do oferecimento de
suporte político (HOWLETT; RAMESH, 2003). O público, por sua vez, é composto por espectadores e
beneficiários-fins da política pública, ou seja, os cidadãos. Quando o peso de um desses grupos for forte o
suficiente para influenciar a agenda de governo, ele será compreendido como um agenda setter (formador
da agenda).
Costa (2008) ressalta que a importância do debate em relação ao papel dos atores na formação da agenda
governamental, deve-se às diferenças de recursos disponíveis e interesses envolvidos, e estes podem atrair
ou afastar participantes de um determinado debate, alterando assim a possibilidade de um item integrar a
lista de políticas públicas. O autor ainda faz uma análise semelhante à de Kingdon (2014) afirmando que os
atores que interagem na formação da agenda governamental se dividem entre um bloco de atores
governamentais e um de atores da sociedade civil. Entretanto, cabe ressaltar que é comum o trânsito desses
atores de um grupo para outro, ou seja, um acadêmico pode virar ator governamental, ou esse ser afastado
e passar a atuar com um grupo de pressão, por exemplo.
Birkland (2007) estabelece quatro níveis de agenda: agenda universal, agenda sistêmica, agenda
institucional e agenda de decisão. Essas classificações das agendas servem apenas para diferenciar entre
intenção ou necessidade de se fazer algo e tomada de decisão propriamente dita. De acordo com Perèz e
Seisdedos (2006), geralmente, problemas que compõem agenda governamental são provenientes da
agenda sistêmica.
A formação de agenda pode ser discutida mediante diversos quadros teóricos, tais como, modelo de decisão
e não-decisão; "garbage can"; teoria dos Múltiplos Fluxos; Teoria do equilíbrio pontuado e Teoria das
coalizões. Esta pesquisa adota o modelo de Múltiplos Fluxos de Kingdon (2014), que elucida que

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determinado tema ou questão entra na agenda mediante a convergência de três fluxos: Problemas, Políticas
Públicas (policies) e Política (politics).
O primeiro fluxo sugere que um tema entra na agenda mediante reconhecimento de um problema. Contudo,
perceber um problema é uma construção política e social que permeia a influência de atores e grupos junto
aos formuladores. Portanto, um problema precisa ser definido e articulado. Os mecanismos que podem ser
utilizados para isso são indicadores; eventos, crises ou símbolos; também, feedback das ações
governamentais.
O fluxo das políticas públicas é também conhecido como alternativas. E o que leva uma alternativa a ser
escolhida em comunidades políticas, corresponde a sua viabilidade, à adesão política, bem como a sintonia
com valores da sociedade. Está intrínseco a esse fluxo a formação de consensos com base na persuasão.
Nesta fase é realizada uma avaliação preliminar sobre os custos e benefícios das várias opções disponíveis
de ação (FREY, 2000).
O aspecto institucional está compreendido no fluxo da política. Compõem esse fluxo: o humor nacional
acerca de determinado tema, isto é, como a sociedade percebe ou avalia as questões; o modo como as
forças políticas se organizam em torno de uma questão; bem como as mudanças do governo. A conjugação
desses fluxos é a formação de janela de oportunidade, ou seja, o momento favorável para determinado tema
entrar na agenda. Outro elemento pontuado pela teoria é a importância de um “ator empreendedor” para
fomentar essa convergência, ou seja, confluência dos fluxos.
Portanto, conclui-se que o processo de formação de agenda está relacionado a uma série de fatores
externos e internos, sejam eles incentivadores ou não. Os fatores externos que influenciam na determinação
da agenda governamental são: i) crises e escândalos; ii) emotividade e impacto emocional; iii) magnitude da
população afetada; iv) pressão dos grupos de interesse; v) meios de comunicação; vi) momento do ciclo
político (teoria da policy window do Kingdon, situações em que a arena política se encontra mais aberta e
favorável); vii) tradição e cultura, ou valores sociais (PERÉZ; SEISDEDOS, 2006). Quanto aos fatores
internos, pode-se ressaltar as características dos órgãos, das instituições e dos aparelhos vinculados à
produção de políticas públicas, e outros (VIANA, 1996).

5. Procedimentos Metodológicos

O artigo trata-se de uma pesquisa qualitativa de alcance descritivo. Para a formação do marco referencial
da pesquisa utilizou-se como técnica a pesquisa bibliográfica, a qual dá suporte interpretativo. A partir dos
elementos visualizados no levantamento bibliográfico, a parte substancial da pesquisa deu-se em campo.
De modo a triangular dados oriundos de várias fontes de evidência, foram utilizadas as técnicas: análise
documental e entrevistas com atores envolvidos com a temática economia solidária em âmbito estadual e
nacional.
A coleta de dados qualitativos foi operacionalizada a partir de dados primários, os quais foram obtidos a
partir de entrevistas semiestruturadas com representantes do Fórum Potiguar de Economia Solidária,
Fundação Interuniversitária de Estudos e Pesquisas sobre Trabalho (UNITRABALHO), Assembleia
Legislativa do Estado do Rio Grande do Norte, além de ex-secretário executivo da Secretaria Nacional de
Economia Solidária (SENAES), estes codificados como E1, E2, E3 e E4, respectivamente. Para determinar
o número de entrevistados foi utilizado a estratégia da amostragem teórica, onde, segundo Flick (2009), os
indivíduos são convidados para participar das entrevistas de acordo com seu nível esperado de insights e
contribuições para os resultados da pesquisa. Foram convidados aqueles indivíduos da sociedade civil
organizada, gestores públicos e políticos que tiveram atuação direta na implementação da política de
economia solidária no governo federal e no estado do Rio Grande do Norte.

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Foi empregada a técnica de categorização na análise das entrevistas (BARDIN, 2011). As respostas foram
categorizadas mediante suas características incomuns a cada uma das entrevistas realizadas. Para auxiliar
neste processo, foi utilizado o software AtlasTI©7. O processo de codificação inicial foi realizado linha a
linha, em que foi feito um estudo rigoroso dos fragmentos dos dados, seguindo os passos indicados por
Charmaz (2009). No segundo momento da codificação procedeu-se ao refinamento e reorganização dos
códigos encontrados, gerando 8 subcategorias e 3 categorias. Escolheram-se as categorias de análise a
partir do referencial teórico sobre a formulação da agenda governamental, desenvolvido principalmente por
John Kingdon (2014). Para a definição das categorias utilizou-se também dos objetivos elencados para a
pesquisa. Assim, foram consideradas três categorias principais (Percepção do Problema, Análise de
Soluções e Cenário Político). Dessas categorias desdobraram-se subcategorias indicativas do tema
proposto, totalizando 08, apresentadas no Quadro 01.

Quadro 1 - Categorias de Análise
CATEGORIAS SUBCATEGORIAS DEFINIÇÃO

C1 - Percepção
do Problema

S1 - Pressão de
grupos de interesse

Mobilização política de grupos dotados de poder ou por ação de
indivíduos estrategicamente posicionados. Atribuição política dos
atores dentro da rede e a sua capacidade de influenciar os demais
atores em processo de articulação.

S2 – Crises Crises locais que ensejam a reflexão sobre o problema. Elementos
que caracterizam o contexto. Situação em que ônus de resolver o
problema é maior do que o de não resolver. Podem estar elucidados
por índices que se vinculam à identificação do problema.

S3 - Eventos
Focalizadores

A realização de eventos que integrem os grupos de interesses
promovendo o debate sobre o problema local.

C2 - Análise de
Soluções

Z1 - Viabilidade
Técnica

Capacidade técnica de implementar a política. Disponibilidade de
recursos para a ação pública.

Z2 - Aprovação da
Comunidade

Disposição dos grupos de interesse em aceitar a política. Grau de
concordância da comunidade ao ser apresentada à solução.

C3 - Cenário
Político

Y1 - Humor Nacional Sentimento ou percepção predominante na sociedade, em relação a
determinada questão política. Evidencia-se em manifestações
sociais, eleitorais, na pressão do legislativo e pressões da imprensa.

Y2 - Coalizões
Políticas

Forças políticas organizadas em relação a uma questão ou
problema. Consensos ou conflitos entre os atores políticos,
sinalizando aos formuladores se o ambiente é propício ou adverso a
uma proposta. Forças e custos políticos envolvidos na decisão de
implementar uma ação.

Y3 - Mudanças
estruturais no
governo

Mudanças estratégicas, seja no chefe executivo ou no legislativo,
quando se estabelece um novo governo - como mudanças de
pessoas em posições estratégicas na estrutura governamental.
Mudanças na composição do congresso, em chefias de órgãos
públicos de destaque, mudanças em competências de ministérios, e
disputas de competências.

Fonte: Elaborado pelos autores com base na codificação das entrevistas (2016).


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6. Percepção do Problema


6.1. Pressão de Grupos de Interesse

Na trajetória da economia solidária como política pública, as ações dos grupos de interesse se apresentam
como elementos de grande relevância. Os entrevistados apresentaram um rico panorama dos grandes
grupos que compõem o movimento da economia solidária, destacando dentre eles, organizações da
sociedade civil, organizações de fomento e apoio e gestores públicos.

[...] dois segmentos são ligados à sociedade civil, que são os grupos, as associações, as
cooperativas e os grupos de produção, que envolve todos, desde os grupos informais até
as empresas recuperadas. E tem as organizações de fomento, que a gente chama:
instituições de assessoria, apoio e acompanhamento, educadores em economia solidária
[...] E tem os gestores públicos, que entram os legisladores (que têm os mandatos
parlamentares) e as secretarias de políticas públicas afins (E1).

É possível perceber a relevância das ações desses grupos para que se evocassem nas discussões e
agendas governamentais nacionais e locais, a temática da economia solidária. Alguns desses espaços de
discussão são os Fóruns Nacional e Potiguar de Economia Solidária, que representam, nas falas dos
entrevistados, a sociedade civil organizada e os momentos nos quais a política pública é discutida e pautada,
visto que o Fórum se constitui em “um espaço de partilha e também de diálogo da política pública” (E1).
Outro fórum de discussão e mobilização da economia solidária são as conferências nacionais, que pautam
temas como: criação do ministério de economia solidária e resistência ao rebaixamento da SENAES a
subsecretaria.
Acerca das conquistas realizadas pela pressão dos grupos de interesse, uma delas foi a inserção da
temática nos Planos Plurianuais.

No PPA, nós fizermos um exercício de estar dentro, discutindo o que teve na gestão de Lula
e Dilma, tiveram aquelas orientações de fazer um PPA participativo, com a contribuição da
sociedade civil na orientação para a implementação de políticas públicas. E a gente
conseguiu colocar a economia solidária, o nome de economia solidária em algumas coisas
[...] (E1).

Em âmbito local, um importante articulador da Política é o Conselho Estadual, que reúne representantes do
governo do estado, da sociedade civil e de instituições de ensino superior. A partir do Conselho e da atuação
da sociedade civil, percebe-se a mobilização no sentido de buscar a institucionalização de uma política
estadual de economia solidária, visto que o Estado, desde a promulgação da lei, em 2006, não possui um
fundo que assegure recursos à política. Uma das tentativas de pressão dos grupos de interesse é
identificada na fala de E1, quando diz que

[...] a gente realizou um abaixo-assinado no estado que foram 800 assinaturas de
organizações, associações, grupos informais, mandatos parlamentares… a gente rodou
uns 8 dos 10 territórios, coletando assinaturas de sindicatos rurais… a gente fez caravanas
e a gente… no dia da audiência nós tínhamos 800 assinaturas institucionais reivindicando
a aprovação… reivindicando ao estado a criação do fundo estadual de economia solidária
e apresentando a nossa minuta (E1).

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Percebe-se, enfim, expressiva participação dos grupos de interesse permeando a entrada da economia
solidária na agenda governamental, o que fica claro tanto em âmbito nacional quanto em âmbito estadual:

Tinham grupos, tinha um grupo de interlocução do Fórum Brasileiro com a SENAES. [...].
De 2006 em diante nós vamos ter a criação do Conselho Nacional de Economia Solidária,
que é um conselho enorme, de 56 pessoas, só que nesse conselho o Fórum Brasileiro tem
a ampla maioria. Primeiro o Fórum Brasileiro indica 15 empreendimentos desses 56
membros do Conselho [...]. Depois você tem na bancada de outros empreendimentos,
redes nacionais de empreendimento e organizações da sociedade civil, todos são do
Fórum, com raras exceções. Quando não são, são próximos. E a bancada do governo.
Então no Conselho Nacional de Economia Solidária a gente dialogava. Tinham as câmaras,
os comitês temáticos, o comitê permanente. Então o diálogo passava por dentro do
Conselho, sem deixar de dialogar com o Fórum Brasileiro (E4).

Só e tão somente o pouco que tem de economia solidária institucionalizada no Rio Grande
do Norte é graças ao Fórum! Não teve uma ação governamental de executivo em relação
a isso. Havia o fórum! E o nosso mandato participa do Fórum. Nós somos uma parte do
Fórum também, não tem nada que acontecesse sem que tenha sido articulado pelo Fórum
(E3).

Vê-se, deste modo, uma política pública inserida na agenda a partir de diálogos permanentes entre entes
representantes dos governos e da sociedade civil. Estes últimos, institucionalizados nos Fóruns Estaduais
e no Conselho Nacional de Economia Solidária, se apresentam como os grandes e principais responsáveis
pelos avanços percebidos na temática no RN e no Brasil.

6.1.2. Crises
No contexto nacional, a criação do conceito e enquadramento das ações de economia solidária está
relacionado à conjuntura de alto desemprego vivenciado pelo Brasil no final da década de 90 e início dos
anos 2000. A partir da percepção deste problema, e da falta de alternativas para solucioná-lo, a proposta
de ações direcionadas pelo conceito da economia solidária ganham força no processo de transição para o
Governo Lula em 2002.
Aglutinam-se atores de diferentes segmentos, seja da academia, da sociedade civil organizada, políticos e
gestores públicos, com o objetivo de propor soluções alternativas para o elevadíssimo desemprego
vivenciado pelo Brasil. A economia solidária é apresentada e reconhecida pela sociedade civil organizada
como uma das alternativas viáveis para combater este problema social, em detrimento ao sistema capitalista
vigente.
Iniciam-se ações e articulações na “1ª Plenária Nacional de Economia Solidária em São Paulo, para [...]
sistematizar esse processo e propor à equipe de transição a criação de um espaço no Governo Federal para
constituir uma política pública de economia solidária” (E4). Posteriormente, estas ações foram incorporadas
ao objetivo de reestruturar o Sistema Público de Trabalho e Emprego, que se transformou em Sistema
Público de Trabalho, Emprego e Renda, atuando com políticas ativas, cujo objetivo é valorizar o processo
de qualificação da mão de obra, em interseção com políticas de desenvolvimento local e territorial, de modo
a promover a geração de renda e emprego.
Ao longo da construção da Política Nacional de Economia Solidária (PNES), demandas críticas contribuíram
para influenciar o foco de atuação da SENAES. Foi crucial para a consolidação da economia solidária na
agenda governamental a inserção da PNES no escopo do Plano Brasil Sem Miséria. A atuação da SENAES

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neste plano, especificamente no eixo inclusão produtiva, reflete o caráter intersetorial da economia solidária,
onde o foco de atuação passa a ser, além do combate ao desemprego e geração de renda, o combate à
extrema pobreza. Singer, Silva e Schiochet (2014) afirmam que o trabalho assalariado é a opção oferecida
pela economia solidária para promover as capacidades e criar oportunidades para que as pessoas em
situação de pobreza possam obter renda por meio do trabalho decente.
No Rio Grande do Norte a inserção da temática foi fortemente influenciada pela trajetória da política e pelas
demandas percebidas em âmbito nacional.

6.1.3 Eventos Focalizadores
No contexto inicial de institucionalização da economia solidária (já se utilizando formalmente esse termo),
alguns eventos focalizadores importantes em âmbito nacional são trazidos na fala de E4

[...] isso foi fazendo, a partir desse conceito, uma aglutinação política desses atores, que
vai desaguar no primeiro Fórum Social Mundial, quando o pessoal da Europa instiga o Brasil
a organizar essa área de discussão no Fórum Social Mundial, em 2001, e o pessoal aqui
então cria o primeiro grupo de trabalho de economia solidária no Fórum Social Mundial
(E4).

Há evidência, assim, para a importância dos projetos de fomento financiados pelo Governo Federal na
promoção de eventos de discussão da política e na implementação de ações notórias de economia solidária,
tanto no contexto estadual como nacional. E1 aponta que, ao longo dos anos, os diferentes projetos
implementados, aqui vistos como eventos focalizadores, têm elevada relevância na afirmação de ações no
Rio Grande do Norte, em diferentes níveis (nacional, municipal), ligadas à economia solidária. Essa
relevância expressa-se no surgimento do Fórum Potiguar de Economia Solidária: “[...] se tinha um seminário
previsto no projeto, um seminário estadual de economia solidária, aquele seminário não era só a AACC que
realizava, passava a ser um encontro do Fórum Potiguar de Economia Solidária” (E1).
Os fóruns caracterizam-se, assim, como momentos nos quais ocorrem a discussão da política e a geração
de produtos de relevância para a articulação da política pública. Outros importantes eventos focalizadores
destacados pelos entrevistados são as conferências de economia solidária, que tanto mostram a
mobilização dos grupos de interesse, como apresentam eventos nos quais há o debate dos grupos de
interesse e o trabalho concreto em cima de algumas demandas.

[...] em 2014, o resultado, o produto da conferência eram diretrizes e ações para a
construção do plano estadual de economia solidária. E as orientações da estadual para o
plano nacional de economia solidária. O Plano Nacional foi criado e regulamentado,
inclusive, não sei se vai ser implementado, mas tudo bem. Mas o Plano Estadual, nós temos
todo o relatório das conferências, das 10 conferências estaduais que foram realizadas (E1).

Deste modo, percebem-se na trajetória da economia solidária, eventos determinantes para os
delineamentos da política pública. Muitos dos elementos considerados como eventos focalizados,
confundem-se, por vezes, com situações de pressão de grupos de interesse. Por meio da realização de
conferências, plenárias e feiras nacionais e pela difusão das incubadores de cooperativas populares em
universidades públicas e privadas, a SENAES conseguiu aglutinar ao seu entorno forças sociais e políticas
importantes para a defesa da economia solidária enquanto política pública, contribuindo para sua
manutenção, mesmo que de forma marginal, na agenda governamental (NAGEM; SILVA, 2013).

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6.2. Análise de Soluções

6.2.1. Viabilidade Técnica
Dada sua característica intersetorial, ao dialogar com outras demandas da sociedade e consequentemente
com outras políticas, os gestores públicos buscaram implementar ações de economia solidária em parceria
com os demais ministérios do Governo Federal. Essa interlocução com outros órgãos está relacionada à
baixa capacidade orçamentária da SENAES, principalmente nos anos iniciais de sua criação, frente às
demandas crescentes por políticas alternativas de combate ao desemprego e geração de renda. Neste
contexto, pode-se segmentar a trajetória da política de economia solidária no que concerne a viabilidade
técnica, financeira e política em 4 distintos momentos.
A primeira iniciativa para viabilizar tecnicamente a política pública de economia solidária no Brasil foi a
inclusão do Programa de Economia Solidária e Desenvolvimento (PESD) no Plano Plurianual 2004-2007
.
Neste primeiro Programa optou-se por inserir, por meio da promoção do associativismo e cooperativismo,
ações emergenciais de geração de trabalho e renda e promoção a iniciativas de finanças solidárias.
Portanto, em virtude do baixo orçamento e capacidade de execução, ações específicas tiveram que ser
priorizadas, como pode ser observado na fala de E4: “Tem que dar prioridades, o mapeamento (da economia
solidária) é prioridade, formação de gestores públicos e, obviamente, dar continuidade a formação de
formadores é prioridade, apoiar as empresas recuperadas em regime de autogestão era outra prioridade”.
A viabilidade de implementação da política esbarrou na limitação de gestão e administrativa da SENAES,
que firmou parceria com a Fundação Banco do Brasil (FBB) para execução dos projetos de forma
descentralizada. A secretária passa a ser responsável por receber as demandas, analisar e priorizá-las com
base em critérios classificatórios. A FBB assumiu a responsabilidade de execução, acompanhamento e
prestação de contas dos projetos executados.
O segundo momento se refere à elaboração do Plano Plurianual 2008-2011. Neste período, o PESD é
reestruturado, focalizando em grandes ações da economia solidária, reflexo do contínuo aumento na
capacidade orçamentária vivenciado até 2007. Entretanto, em função de diversas crises (econômica
mundial, mensalão, criminalização das Organizações Não Governamentais), cria-se uma nova estrutura de
gestão e regulação dos contratos no MTE, culminando com a instituição do Sistema Nacional de Convênio
do Governo Federal, exigindo dos atores governamentais e das entidades da sociedade civil aprender a
manejar os novos instrumentos informatizados e as normas.
O processo de criminalização das ONGs mudou a postura do Governo Federal, que passa a se posicionar
contra o estabelecimento de convênios com estas entidades. Este fato impacta na viabilidade técnica da
implementação da política solidária, uma vez que esta política era executada majoritariamente pela SENAES
em parceria com ONGs.
Alguns avanços, que contribuíram para a viabilidade técnica da política de economia solidária, são
apontados pelo ator E4, tal como a constituição, via Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico
Sustentável (BNDES), de uma linha de crédito específica para empresas recuperadas.
O terceiro momento foi a inserção da Política Nacional de Economia Solidária no eixo inclusão produtiva do
Plano Brasil sem Miséria
com o objetivo de contribuir com o esforço nacional para a erradicação da pobreza
extrema. Para tanto, foram ampliados os investimentos e a escala das ações que viessem a contribuir com
a capacidade de auto-organização e autogestão de grupos populacionais e comunidades caracterizadas por
vulnerabilidades sociais, fortalecendo e expandindo a economia solidária enquanto estratégia
emancipatória. A ampliação dessas ações foi possibilitada pela cooperação técnica e financeira com o
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), com pactuações de ações com entes
federados e organizações da sociedade civil (SINGER; SILVA; SCHIOCHET, 2014). Neste sentido, denota-

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se que a intersetorialidade, caracterizada pela promoção da efetividade por meio da articulação entre
instituições governamentais e entre estas e a sociedade civil (NASCIMENTO, 2010), influência
sobremaneira no fortalecimento da política de economia solidária no Brasil, garantido musculatura política,
financeira e técnica a sua implementação. Constatação confirmada pelo entrevistado E4: “A economia
solidária ela tem na essência, no seu escopo essenciais essa [...] característica intersetorial. Ela dialoga
com outras demandas da sociedade e consequentemente com outras políticas (E4)”.
A partir da cooperação com o MDS e com o Ministério do Meio Ambiente para promover políticas para
catadores de lixo, houve a necessidade institucional de estabelecer parcerias com os Estados e Municípios
para a descentralização de recursos e execução dos projetos. Esta ação mudou o processo de gestão dos
convênios, mesmo que a grande maioria ainda fossem executados pela ONGs, e da própria efetividade da
política. Esta nova lógica de implementação da política representou significativos obstáculos ao processo
de execução da política:

[...] a avaliação disso é que os Estados não estavam preparados para isso. E as
prefeituras, algumas também não. Tem convênio que a gente celebrou em 2011 e
agora em 2016 a gente teve que cancelar sem execução. Convênios celebrados
em 2012 que a execução foi um trambolho. [...] Mas no cômputo geral, o desafio é
muito grande, para os governos do Estado e para a gente. Por que quando a gente
conseguiu dinheiro [...] a gente infelizmente se deparou com esse problema na
ponta (E4).

Desde 2014, em decorrência da crise econômica, a SENAES tem perdido recursos em virtude da queda de
arrecadação e corte nos gastos públicos, o que tem impactado na execução dos convênios com os Estados,
Municípios e ONGs e, consequentemente, influenciado negativamente na implementação da PNES.
Segundo o entrevistado E4, com a crise de 2014 ocorre “[...] aumento do desemprego e ao mesmo tempo
[...] o enfraquecimento da política, ou seja, da redução da capacidade política de fazer intervenção na
realidade” (E4). A partir desta nova realidade, identificou-se o quarto momento da política. Em virtude do
contexto de dificuldade de execução da Política de Economia Solidária pelos entes subnacionais e da crise
econômica, no PPA 2016-2019
, o foco da SENAES passa a ser a implementação das políticas estaduais e
municipais de economia solidária “Agora você sistematiza lá no Estado pra gente poder dialogar. Convênios,
só se tiver Plano [Estadual de Economia Solidária], e naquilo que os dois planos [Nacional/Estadual] estão
de acordo” (E4). O Governo Central, a partir do processo de inserção e fortalecimento dos estados e
municípios na execução dos projetos de economia solidária, passa a induzir a criação destes planos a nível
estadual e local.
O Estado do RN constituiu seu Plano Estadual de Economia Solidária em 2006, por meio de um processo
de articulação entre o Poder Legislativo e o Fórum Estadual de Economia Solidária. Entretanto, o plano
ainda não foi sancionado pelo governador do Estado, sendo promulgado pela própria Assembleia
Legislativa. Esta realidade indica que, apesar da inserção da economia solidária na agenda do Governo
Federal e das várias ações para induzir a implementação da política nos estados, no RN ainda não houve
tal efetivação. A fala dos entrevistados E3 e E1 indicam esse cenário.

[...] essa daí já [é] uma primeira dificuldade na questão da institucionalização.
Porque se o executivo não sanciona a lei, então ele não está reconhecendo a lei
[...] Então essa foi uma barreira complicada, pra gente inclusive entender as
dificuldades que tem na institucionalização, de incorporar a economia solidária
como uma política de Estado, como uma política pública (E3).

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Existe uma boa vontade, muita simpatia pelo tema da economia solidária [...], mas
não há uma responsabilidade do estado para com o fortalecimento da economia
solidária. Há uma negação inclusive da Política Estadual de Economia Solidária [...]
porque se você, desde 2006 [...] você não consegue estruturar uma política pública
[...] não você não regulamenta ela no orçamento do Estado. Não tem uma ação que
seja previsto dentro da estrutura do Estado para executar a economia solidária
(E1).

A análise indica que, apesar das dificuldades de implementar no âmbito estadual, o Governo Federal teve
papel indutor da política nos estados e, principalmente, no financiamento das ações da economia solidária.
Wright (1988) afirma que a oferta de apoio, do governo federal aos estados e municípios geralmente ocorre
em troca de sua concordância na implementação de uma política, condução de um projeto ou
desenvolvimento de alguma atividade. Para Arretche (2000), este tipo de ação se trata de um mecanismo
de indução e sua importância foi identificada nos processos de descentralização de políticas sociais no
Brasil. No caso do RN, a indução foi importante para incentivar a constituição da Política Estadual de
Economia Solidária, mesmo que não estruturada, permitindo, assim, o acesso do Estado e Municípios a
recursos nacionais da PNES.
Os resultados indicam dicotomia entre a institucionalização e a prática da economia solidária em âmbito
estadual. Inúmeros projetos e ações foram executadas, por meio do financiamento do Governo Federal,
mas não houve avanços na inserção da temática na agenda do governo estadual e conscientização da
importância do tema para solucionar o problema do desemprego.

6.2.2. Aprovação da Comunidade
No que concerne à aprovação da comunidade, há tendência ao consenso proposto pelos formuladores,
pois, os burocratas que delineiam a política pública, em sua maioria, são oriundos dos movimentos sociais,
os quais se configuram como grupos de interesse. Isto ocorre, tanto em nível nacional quanto em nível
estadual, segundo a fala de todos os entrevistados. Destacam-se algumas para elucidar este ponto:

[...] todo processo de construção e condução da política foi com muito diálogo,
certo? De 2003 a 2006 o diálogo era diretamente com o Fórum Brasileiro de
Economia Solidária. Tinham grupos, tinha um grupo de interlocução do Fórum
Brasileiro com a SENAES (E4).

[...] o pouco que tem de economia solidária institucionalizada no Rio Grande do
Norte é graças ao Fórum! Não teve uma ação governamental de executivo
[estadual] em relação a isso, né? Havia o fórum! (E3).

Em nível nacional, de onde a Economia Solidária surge enquanto política pública e se difunde para os níveis
subnacionais, é interessante destacar que a demanda emerge no bojo dos movimentos da sociedade civil
e desse ponto aparecem os atores que são incorporados ao governo, especialmente, no momento da
eleição do PT.
Ainda sobre a perspectiva da aprovação da comunidade em nível nacional, o tema ganha maior legitimidade,
tendo em vista uma reorientação do governo em incorporar e vincular as ações de economia solidária no
Plano Brasil Sem Miséria do MDS, fazendo com que as ações de economia solidária sejam estratégicas no
combate à pobreza extrema.

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Em nível estadual, os acordos em torno da temática são induzidos pela formatação da política em nível
nacional. Havia uma predisposição da sociedade civil à alternativa da economia solidária para a questão do
trabalho e renda. Embora, o avanço do tema não seja significativo, pois é reconhecida uma dificuldade de
compreensão do conceito e sua incorporação às ações públicas.

6.3. CENÁRIO POLÍTICO

6.3.1. Humor Nacional
Durante o governo Collor e governo FHC, as empresas (sobretudo as da indústria têxtil), estavam passando,
segundo E2, por uma crise falimentar. E isso desencadeou manifestações lideradas pela Central Única dos
Trabalhadores (CUT) juntamente com as universidades para dar apoio aos trabalhadores. Esse sentimento
é observado na fala de E2, quando afirma:

Ocorreu um encontro em São Paulo puxado pela CUT com instituições de nível superior
para pensar de que modo as universidades poderiam acompanhar os trabalhadores, até
mesmo revelar que cenário era esse. [...] então vários pró-reitores do Brasil inteiro foram
provocados a procurar alternativas que dessem apoio à classe trabalhadora. Isso puxado
pela CUT e pelo PT. Eis que surgiu a ideia desses reitores que lá estavam de criar uma
fundação e essa fundação teria o intuito, a missão de fortalecer a classe trabalhadora.

Tal contexto aponta o humor nacional do Brasil como influenciado pela classe trabalhadora unida aos
acadêmicos em busca de outras saídas, bem como pressões no governo. A sequência da fala do E2 mostra
que a influência da UNITRABALHO fora fundamental para iniciar práticas autogestionárias de recuperação
dessas empresas falimentar com o uso da economia solidária.

[...] quando a UNITRABALHO começou os estudos era estudando as transformações no
trabalho e já apagando incêndio, porque já estava existindo empresas falindo. [...] Aí
começou a trabalhar a perspectiva autogestionária. Então, quando as empresas iam
falindo, tinha necessidade de passar a gestão para os trabalhadores [...] para pagar dívidas
trabalhistas (E2).

A situação de desemprego é uma tônica na inserção da política de economia solidária na agenda
governamental nacional. Isso fica evidente na fala de E4, ao lembrar:

[...] quando a gente tinha elevadas taxas de desemprego, você já tinha a economia solidária
como essa estratégia, que [...] combinava a necessidade de se organizar para reduzir
subordinações, subalternidade da pequena produção, mas também vontade e
reconhecimento até de interesse, até meio pragmático também de que era preciso se juntar
pra ganhar força.

Diante desse cenário, a economia solidária se apresenta como saída para solucionar ou ao menos minimizar
a crise de emprego. Vale ressaltar que esse sentimento estava presente, principalmente, entre os atores
envolvidos, que por sua vez incentivaram por meio da própria política a adesão das comunidades para a
complementação da renda, o que é reforçado na fala do E4: “a economia solidária tinha essa característica
de ser uma alternativa para aquelas pessoas que, ou estavam desempregadas, ou tinham dificuldade de
acessar o mercado de trabalho, era uma estratégia de geração de trabalho, de obtenção de renda”.

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Entretanto, em 2016 ocorre uma mudança no cenário político, e a SENAES é rebaixada a subsecretaria. O
movimento da economia solidária tem tentado influenciar os atores a resistirem às mudanças, isso foi
observado por E1 que advertiu a sensação de paralisia do movimento:

[...] ela é uma subsecretaria dentro de alguma coisa, então ela foi rebaixada, ela perdeu
força política e estrutura orçamentária [...]. E o movimento de economia solidária está
calado [...], porque enquanto as escolas estão sendo sucateadas, os estudantes ocupam
as escolas, e aí a Política Nacional de Economia Solidária tá sendo rebaixada. A gente saiu
em 2010, o movimento gritando, e aprovando dentro da Conferência Nacional de 2010, a
criação do Ministério de Economia Solidária. E em 2016, a gente sai de uma secretaria
nacional de um ministério, para uma subsecretaria dentro de algum departamento, de
alguma estrutura, que a gente não sabe nem o que é.

Os relatos mostram que, apesar dos avanços da luta pela economia solidária, o movimento está silenciado
momentaneamente
com as recentes mudanças no cenário político nacional, sendo instigado por E1 a se
manifestar e exercer suas influências políticas e pressionar os governos a olhar para a economia solidária.

Nesse cenário, porque a gente sabe que quanto mais fragilizada a política nacional, isso é
uma cascata, o estado vai sentir menos interesse. Porque a economia solidária teve um
boom desde o ano 2006 a 2012, aproximadamente? Porque tudo falava em economia
solidária nacionalmente (E1).


6.3.2. Coalizões Políticas
As coalizões são identificadas como forças políticas organizadas em relação a uma questão ou problema.
Que podem também abranger questões de consensos ou conflitos entre os atores políticos, sinalizando aos
formuladores se o ambiente é propício ou adverso a uma proposta. Abrindo espaço ainda para questões de
forças e custos políticos envolvidos na decisão de implementar uma ação.
A partir das falas dos entrevistados conseguiu-se identificar a primeira delimitação, em relação à presença
de forças políticas organizadas em torno de uma questão ou problema no Rio Grande do Norte:

A gente tem a coordenação executiva que são nove instituições, pelo menos uma
representando cinco dos territórios. [...] essas nove elas mobilizam e animam a dinâmica
mensal de reuniões e nessas reuniões a gente pauta conjuntura política, pauta política
pública do estado, pauta as dificuldades do desenvolvimento da economia solidária no
campo da comercialização, da produção, pauta parceria. Por meio da lei estadual de
Mineiro. Na lei estadual, ele institui o conselho, ele cria o Conselho Estadual de Economia
Solidária de 12 componentes, sendo 6 do governo do estado, e 6 da sociedade civil
(envolvendo a universidade) (E1).

Aqui os movimentos que trabalhavam particularmente na área, mais na área rural, que
trabalhavam com entidades de geração de renda, já faziam um debate, já conversavam, já
discutiam sobre a questão de já participar do movimento nacional de economia solidária
(E3).

[Em] 2004 começa a debater a necessidade de fundar o fórum, e o nosso mandato inclusive
participa da fundação do Fórum. [...] A gente criou um Fórum aqui no estado, de economia
solidária [...] fazendo um movimento inclusive nacional, não é? (E3).

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No entanto, há de se perceber a falta de coalizões políticas, no âmbito estadual e nacional, para a
estruturação e fortalecimento da política de economia solidária na agenda governamental. No RN, E3
menciona o fato de que a política de economia solidária não foi sancionada pelo governo do Estado à época,
mas promulgada.

[...] a dificuldade da gestão entender a importância da temática, reside no seguinte fato: a
lei na verdade foi uma lei promulgada, ela não foi sancionada, e a gente faz um movimento
para criar a questão em 2010, 2011. Aliás, 2011, 2012 pra criar a história do Fundo Estadual
de Economia Solidária. O movimento, o Fórum estadual de Economia Solidária
desencadeia um debate com as instituições, com os movimentos, com as várias
organizações para a elaboração de um projeto do fundo estadual, e a gente faz inclusive
uma audiência pública aqui na Assembleia, formata a lei do fundo, cria uma articulação de
um abaixo assinado com as várias organizações, várias entidades, vários movimentos de
economia solidária, faz uma assembleia aqui e entrega ao Secretário [...] um projeto do
fundo, um projeto de lei que, quem pode instituir o fundo é o Executivo. E depois, bom, e o
fórum continuou com todas as dificuldades, mas também reuniões mais periódicas tentando
se articular, cobrar a efetivação da política pública, a luta pela institucionalização e pela
política de economia solidária estadual. É a luta do fórum (E3).

Em âmbito nacional, E4 ressalta a mesma situação de desarticulação e desinteresse. Tanto com relação às
visualizações acerca da proposta de economia solidária, quanto com relação às diferenças político-
partidárias que geraram a saída do ex-secretário nacional de economia solidária, Paul Singer, e sua equipe.

Tem esse lado político também, do jeito que o PDT disse assim: "eu quero o Ministério
todo", entra uma outra crise, porque Singer tem que entregar porque não é PDT. E o PDT
precisa de um espaço para poder acalmar a sua bancada. [...] Depois o pessoal: "Não,
Singer ninguém vai mexer", tanto é que o PDT sai do Ministério e volta o Rossetto, que era
PT, nesse outro momento, nos últimos momentos [...] dessa forma, por esse fator, nós
conseguimos negociar um programa que ficou: promoção do trabalho decente e da
economia solidária. Então nós não sub-sumimos, não ficamos subsumidos ali dentro. Nós
colocamos um programa e o pessoal: "é trabalho e economia solidária". Não! É promoção
do trabalho decente e da economia solidária. Se você entrar no PPA do Brasil, você vai ver
isso hoje. E daí nós formulamos o objetivo. Já tínhamos o plano, aí como diz, o plano dentro
do funil, a conferência que é os discursões está aqui, o plano está aqui, quando você vai
elaborar o PPA você já está aqui, já perto do bico do funil, e até chegar lá no orçamento é
impossível de executar (E4).

O processo que E4 apresenta como afunilado denota também a situação de tentativa de coalizão e, por
outro lado, de desinteresse das outras camadas políticas com a temática da economia solidária,
apresentando-a como subproduto de uma lógica diferente da que a temática preconiza.

6.3.2. Mudanças Estruturais no Governo
As mudanças dentro do próprio governo é um dos fatores capazes de afetar a agenda: mudança de pessoas
em posições estratégicas no interior da estrutura governamental (turnover); mudanças de gestão; mudanças
na composição do Congresso; mudanças na chefia de órgãos e de empresas públicas. Esses
acontecimentos podem exercer grande influência sobre a agenda governamental ao desencadearem

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mudanças que potencializam a introdução de novos itens na agenda, ao mesmo tempo que podem também
bloquear a entrada ou restringir a permanência de outras questões (SOUZA, 2006). O início de um novo
governo é, segundo Kingdon (2014), o momento mais propício para mudanças na agenda.
No contexto da Economia Solidária, a conjuntura política brasileira foi determinante para inserção da
temática na agenda governamental. Seu início foi marcado pela eleição do presidente Lula em 2002, figura
que já apresentava sensibilidade às questões das lutas trabalhistas, conforme as falas dos entrevistados E3
e E4:

Quem coloca isso na pauta, eu estou dizendo assim, como é que se formou a agenda?
Você tem a sensibilidade do governante e do partido principal eleito. Você tem um
problema social, que tem que ter respostas pelo novo governo e num limite que Lula
estabeleceu na campanha (E3).

Institucionalmente ele começa a ter uma atenção, por parte dos entes
governamentais, a partir da posse do Presidente Lula, [...] quando há inclusive uma
mudança no Ministério do Trabalho. E no Ministério do trabalho é criada a SENAES
[...] que trata disso, que foi coordenado, assumido por Paul Singer durante o governo
do presidente Lula e a Presidenta Dilma (E4).


Ao analisar esse construto em âmbito estadual, verifica-se que as ações da economia solidária giram em
torno da centralização pelo governo federal. Entretanto, constata-se que a ação da sociedade civil
organizada foi fator determinante para a construção da temática no Rio Grande do Norte, culminando na
efetivação do Fórum Potiguar de Economia Solidária e consolidando a proposta de que apesar das barreiras,
mudança para um cenário desfavorável em âmbito nacional e pouco empenho em conhecer a temática por
conta dos governantes locais, a Economia Solidária existe e resiste. E1 sintetiza algumas dessas afirmações
em sua fala:

[..] a gente debate quais são os desafios, quais são projectivas, o que a gente propõe
de política pública, o que a gente decide, que manifestação a gente vai fazer para
dizer que nós existimos (E1).

No estadual, não. Existe muita boa vontade, muita simpatia pelo tema da economia
solidária de sujeito dentro da secretaria, que é ligada aos projetos de desenvolvimento
da economia solidária, mas não há uma responsabilidade do estado para com o
fortalecimento da economia solidária (E1).

Então entrou uma outra pessoa como secretário titular da Secretaria de Trabalho e
Ação Social. E aí a gente fez sugestões e ele foi e reconheceu um pouco, e foi
instalado o primeiro conselho. E com a lei, tinha que ser instalado o conselho. Tem
uma lei que institui a política e cria o Conselho Estadual de Economia Solidária. Foi aí
que começou a surgir os projetos mais efetivos do Estado com a SENAES (E3).

Entretanto, apesar dos esforços para institucionalizar a política de economia solidária em âmbito nacional e
estadual, ainda não foi possível sair da zona periférica que se encontra a temática e ela ainda enfrenta
limitações. As falas de E4 nos permite claramente tal visualização.

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Na época, antes do MDS, que aglutinou várias áreas, você tinha a secretária que tinha
status de ministério [...]. Tinha um determinado momento que a gente mapeou que a
gente dialogava com 22 áreas de governo diferentes. Nunca conseguimos chegar no
núcleo central de governo, mas vai entrando em alguns pontos. [...] A limitação, nós
tivemos limitações fortes. Depois você tem, ainda no primeiro Governo Lula, você tem
a grande crise, a primeira grande tentativa de derrubar o governo em 2005, por que
disse que a gente ficava dando dinheiro pras ONGs e que aquilo era desvio de recurso
pro Partido. A crise nas ONGs, enfim, aquilo ali foi uma crise pesada (E4).

Aí vem o momento da eleição de Dilma. Na Conferência de 2010, que é antes da
eleição, é o momento em que a Conferência é convocada para estabelecer a Política
Nacional de Economia Solidária, sistematizar a política nacional (E4).


O que se torna claro perante à atual conjuntura política é que a temática da Economia Solidária apesar de
ter passado por momentos de ascensão nos últimos 14 anos, agora enfrenta uma série de dificuldades de
articulação.

Nesse momento de crise do Brasil, da SENAES e da política de economia solidária, as
perspectivas são as piores possíveis. [...] eu não tenho outra forma de dizer. Esse diálogo
se rompeu porque o movimento tem dúvida: "bom, eu vou retomar um diálogo forte como
tinha antes com a SENAES com esse perfil de dirigentes? Com um governo que a gente
considera, a maioria considera, um governo ilegítimo (E4).

Que em meio a uma série de crises governamentais ameaçam sua continuidade, confirmadas fortemente
pela fala do E4:

Primeiro risco decorrente de uma crise que se iniciou em 2014, certo? Que é uma redução...
você tem o aumento do desemprego e ao mesmo tempo você tem o enfraquecimento da
política, ou seja, da redução da capacidade política de fazer intervenção na realidade, o
risco é de ela ser uma "politiquinha", uma "politicazinha". [...] O segundo risco é o risco que
a gente chama de "degeneração da política". O que é que é a degeneração da política?
Com a recomposição do quadro de dirigentes na Secretaria, e esse quadro de dirigentes
notadamente não traz experiência nenhuma de economia solidária. [...] E alguns não trazem
experiência nenhuma de gestão. Então você tem o risco de degenerar a política, certo?
Dela apodrecer. Por outro lado, eles vão lá no Congresso e incentivam os deputados da
bancada a botar emendas (E4).

Denota-se que mudanças estratégicas no cenário governamental brasileiro, aliada a mudanças de pessoas
em posições estratégicas na estrutura governamental ditaram o papel da economia solidária na agenda do
governo, tanto no que concerne à sua inserção e fortalecimento na agenda governamental, quanto à perda
de seu protagonismo.



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Considerações Finais

A inserção da política de economia solidária na agenda governamental é influenciada por elementos que
circundam os grupos de interesses, o contexto local, as disputas e pressões políticas. Isso ficou evidenciado
no Brasil com a crise de desemprego no final do governo FHC e com a situação falimentar das empresas
que levou muitos trabalhadores a assumir a gestão dessas organizações deficitárias. Soma-se a isso, o
contexto político brasileiro com a chegada do presidente Lula, em 2002, e sua permeabilidade às demandas
dos movimentos sociais que trouxe para a agenda o debate de uma economia autogestionária - a economia
solidária. Contudo, a entrada na agenda de uma política possui complexidades que foram levantadas em
cada eixo aqui analisados.
A partir da subcategoria “Crise” observou-se que a demanda por políticas públicas alternativas para
combater o desemprego foi crescendo à medida que esse processo se acentua no país, chegando a 12,7%
em 2003. A partir da percepção deste problema, e da falta de alternativas para solucioná-lo, a proposta da
economia solidária é inserida na agenda governamental. Apesar da demanda inicial ter prevalecido ao longo
dos anos, o caráter intersetorial da economia solidária e o seu processo de construção envolveu a busca de
soluções para outras importantes demandas da sociedade, como o combate à fome e a pobreza extrema e
a sustentabilidade ambiental.
A subcategoria “Viabilidade Técnica” mostrou que seu caráter intersetorial, por meio da articulação de
parcerias com outros ministérios, e a necessidade de expandir as ações e políticas da economia solidária
contribuíram para o fortalecimento da política ao longo dos Governos Lula e Dilma, por meio do aumento
expressivo no orçamento e da estruturação de uma Política e Plano Nacional de Economia Solidária.
No que diz respeito à subcategoria “pressão de grupos de interesse”, evidencia-se o fato de que a temática
da economia solidária passa a fazer parte da agenda governamental a partir de grandes mobilizações,
principalmente da sociedade civil, mobilizações estas que geraram movimentos focalizadores, os quais
renderam importantes produtos à economia solidária tanto como movimento quanto como política pública.
Em relação às subcategorias “Coalizão Política” e “Mudanças na Estrutura Governamental”, conclui-se que
a mudança da conjuntura política foi fator decisivo para o avanço na temática no Brasil, apesar de iniciativas
desinteressadas, principalmente à nível governamental estadual, chegando ao ponto da temática ser tratada
de forma deslocada dos seus princípios. Durante a última década, os esforços para se institucionalizar uma
política, fundar fóruns e conselhos rendeu um avanço considerável para a economia solidária, cenário
ameaçado dada a descontinuidade e brusca ruptura com modelo governamental previamente existente -
com foco nas questões sociais, chegando ao ponto de ser percebido o risco iminente à sua continuidade e
efetividade.
Como sugestão para trabalhos futuros, indica-se a necessidade de analisar o contexto no qual decorre o
processo político, considerado por John Kingdon o mecanismo essencial de junção dos três fluxos. Portanto,
é necessário que os próximos estudos focalizem o papel e o peso dos diferentes atores no processo de
inserção da economia solidária na agenda governamental, bem como mapiem a forma como afetam a
disponibilização de alternativas e a escolha de soluções e modo como utilizam os recursos. Além disso,
após a recente descentralização da política é pertinente analisar as relações estabelecidas entre os entes
subnacionais e o governo federal no tocante a implementação da política e de que forma se dá a
coordenação intergovernamental.


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