MATERNIDADE E CULPA ORIGINÁRIA

UMA LEITURA DE "AS MULHERES DE TIJUCOPAPO"

Autores

Palavras-chave:

Maternidade, Identidade, Narrativa contemporânea, Marilene Felinto, Violência intergeracional

Resumo

O artigo propõe uma análise do primeiro romance de Marilene Felinto, As Mulheres de Tijucopapo, com foco no tema da maternidade, elemento central da obra. A pesquisa se justifica pela necessidade de compreender como, na literatura brasileira contemporânea, surgem autoras capazes de retratar experiências femininas marginalizadas, destacando a relação entre identidade, maternidade e culpa. Ao explorar a obra, o estudo examina como a protagonista, Rísia — uma mulher negra, nordestina e migrante — lida com sua identidade fragmentada, resultado de um histórico de opressão, violência e abandono materno. A abordagem adotada é qualitativa, fundamentada na análise literária e na crítica feminista. O estudo dialoga com teóricos como João Camillo Penna, que propõe uma leitura do valor simbólico da lama e da terra no romance, sugerindo uma origem genealógica feminina e a falta de vínculos maternos sólidos. Além disso, as pesquisas de Regina Dalcastagnè sobre o campo literário brasileiro destacam como a autora desafia discursos dominantes ao apresentar personagens femininas que rompem com os estereótipos sociais. A análise da dimensão temporal do romance é enriquecida pelas contribuições de Benedito Nunes, que sublinha a importância do tempo narrativo na construção da memória da protagonista. O tempo psicológico de Rísia, com seu fluxo de consciência e memórias pessoais, determina o ritmo da narrativa, sendo o passado o tempo predominante, com forte ênfase nas lembranças da infância. A pesquisa também examina os relacionamentos mais significativos de Rísia, com destaque para a relação com sua mãe, figura fundamental na formação de sua identidade. A análise recorre a teorias de Lélia Lehnen e Hélène Cixous para interpretar os símbolos e temas recorrentes na obra, especialmente aqueles que envolvem a construção da subjetividade feminina e a relação materna, marcada por conflitos e complexidade. O estudo sugere que a narrativa constrói uma identidade feminina que se distancia dos moldes tradicionais, apresentando uma protagonista marcada pela dor e pelo exílio, tanto físico quanto emocional. O estudo conclui que a obra de Marilene Felinto oferece uma crítica contundente às estruturas patriarcais que moldam a experiência das mulheres no Brasil. Rísia simboliza a luta contra um destino preestabelecido, resistindo à narrativa de submissão imposta às mulheres de sua classe e origem. Assim, As Mulheres de Tijucopapo se afirma como uma obra essencial para a compreensão da subjetividade feminina na literatura contemporânea.

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Publicado

2025-06-04

Como Citar

Sposato, M. (2025). MATERNIDADE E CULPA ORIGINÁRIA: UMA LEITURA DE "AS MULHERES DE TIJUCOPAPO". Inventário, (36), 103–120. Recuperado de https://periodicos.ufba.br/index.php/inventario/article/view/64398